sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

4 DE FEVEREIRO: AS LOAS ACTUAIS DOS NACIONALISTAS AOS REGIMES CAPITALISTAS *ULTRAMARINOS*




O Presidente da República do antigo regime, almirante Américo Tomás, numa vista "guiada" às antigas colónias








Três imagens de Angola nos últimos 30 anos: o remeço da circulação do caminho de ferro de Benguela; o Huambo actual e durante a guerra civil








1 - No próximo dia 4 de Fevereiro, vão comemorar-se 51 anos do que se convencionou chamar início da guerra colonial nas antigos território ultramarinos portugueses.


Curiosamente, são poucas, hoje, as vozes, pelo menos à boca cheia, que vociferam contra a entrega "sem vergonha" das antigas províncias ultramarinas, contra a "descolonização desastrada", contra esses "vende-pátrias", como fazia, ainda há poucos meses, esse estadista bem comportado e arregimentado pelos esconsos lugares de depravação, como é o caso do actual Ministro dos Negócios Estrangeiros.


Os escuriços de algumas dezenas de anos atrás são, agora, os verdadeiros desbravadores da acumulação primitiva que a era capitalista fez penetrar, verdadeiramente, nos últimos 20 anos, logo transformaram-se, finalmente, em parceiros.


Na realidade, aqueles arautos de antanho, que não é, aliás, de muito antanho, descobriram agora que o seu nacionalismo de pacotilha, se esborou, porque os que alcançaram a independência e são hoje os impulsionadores dos novos regimes capitalistas naqueles novos países, ensinaram-lhe, em pouco tempo, - e eles aprenderam também - que a presença colonial, não era somente posse de terras e de dinheiro, mesmo até introdução de algumas máquinas e outros meios produtivos, mas, essencialmente, uma "artimanha económica" que é a introdução do salariado, em larga escala no espaço nacional.

Com efeito, a passagem da ordem económica feudal ou quase feudal, que existia nas ex-colónias, em 1974, numas mais, noutras menos (Angola estava a ser um cadinho nessa transformação, mas fora a guerra o seu motor!) , para a ordem económica capitalista, que, actualmente, está a ser dominante nas antigas colónias está a ser obra, pela violência (a corrupção, o despotismo, a intervenção brutal do poder de Estado), da nova classe capitalista, que emergiu nos destroços dos laivos de um pseudo-socialismo, que não era, nada mais, nada menos, que da iniciação do presente "liberalismo económico", mas então germinava sob a forma de capitalismo de Estado.


Ou seja, a força, que os tais "nacionalistas" do Império defendiam e praticavam no período anterior ao 25 de Abril, sem conseguirem subverter o sistema económico, porque nunca conseguiram descortinar o que era necessário para pôr em marcha um novo modo de produção, foi feito, em marchas forçadas, desde os anos 90 por essas novas classes. 


E fizeram-no, realmente, pela força. 


Ora, esta está a ser o verdadeiro motor transformador da velha sociedade feudal-gentílica nessas colónias. 


O que significa, para a economia política, que essa força, colocada na verdadeira concepção de transformação social, é um agente económico. 


Até os "nacionalistas de pacotilha" do velho Império aplaudem, agora, com as garras de velhas raposas cheirosas de negócios fáceis.
  
2 - Os dirigentes de Lisboa do colonialismo português do anterior regime nunca tiveram uma perspectiva de transformar as sociedades dessas colónias.


Para eles, esses territórios africanos eram uma coutada, que servia, primeiro, como área de retirada de recursos naturais, e em lugar secundário, como processo de escoamento de algumas matérias transformadas, bem como lugares de degredo, e de uma colonização incipiente, baseada na formação de comunidades brancas auto-suficientes, que viviam ou sobreviviam, essencialmente, com o seu próprio trabalho, e uma exploração desenfreada, sem dó, nem piedade, em regime de escravatura dos autóctones negros, que deu origem as primeiras grandes revoltas.


Alguns colonos capitalistas, que procuraram modificar este estado de coisas, nunca se sentiram apoiados pela chamada "Metrópole" para empreender essa via, que, aliás, era vista e sentida, em Lisboa como "atitudes autonomistas e até separatistas". 


E reprimidos, normalmente, com afastamentos para fora da colónia, ou até com prisões.





A baía de Luanda na actualidade


3 - Mas, seria o colonialismo português um conceito e uma prática apenas dos velhos mentores e defensores do Regime do Estado Novo? 


Em escalas diferentes, por vezes até com argumentações diversificadas, monárquicos, situacionistas pró- Estado Novo, oposicionistas republicanos, socialistas e até o PCP estiveram irmanados, praticamente, até ao início da revolta colonial (e ela não começou, realmente, com a questão angolana, mas com o chamado Estado da Índia, nos anos 50 do século XX, na defesa do Portugal "pluricontinental").


A "extrema-esquerda da República", como se intitulava o grupo da revista "Seara Nova", onde pontificavam António Sérgio, Jaime Cortesão, Aquilino Ribeiro, entre outros,  mantiveram, desde a sua fundação até, pelo menos, a segunda metade do século XX uma linha constante e consistente de defesa da política colonial.


Já na década de 60, em plena guerra em desenvolvimento, os antigos republicanos, muito próximos do velho socialismo social-democrata, como Cunhal Leal, oposicionista de Salazar, defendia na sua obra "Coisas do Tempo Presente - o colonialismo dos anti-colonialistas: "É preferível, mil vezes preferível, o nosso colonialismo, honrado e progressivo, ao colonialismo de certos anti-colonialistas, em especial aos da Rússia, com os seus campos de concentração e de trabalho forçado e com milhões de vítimas, e ao dos Estados Unidos da América, com o seu colonialismo interno".


O PCP, nascido em 1921, esteve em vias de incluir no seu primeiro programa o desprezo total pelo movimento anti-colonial, preconizando o informe inicial do Comité Central "a venda" das colónias aos ingleses. 


Só a intervenção forçada do delegado da IC, Humbert Droz, levou aquele organismo a abandonar a sua pretensão.


Praticamente, ate à segunda metade dos anos 50, a questão colonial esteve arredada do programa partidário daquele partido.


No I Congresso, segundo o jornal Avante de Novembro de 1943, o informe do seu principal dirigente, um jovem estudante em ascensão chamado Álvaro Cunhal, que usava um pseudónimo (Duarte) estava, justamente, intitulado, "Unidade da Nação Portuguesa na Luta pelo Pão, pela Liberdade e pela Independência". 


Defendia Cunhal que o PCP deveria encabeçar uma "luta nacional contra o fascismo", enquadrando este "nacional" os territórios do Minho a Timor-Leste.


Em 1946, o PCP efectua o seu II Congresso, sendo o relator o mesmo Álvaro Cunhal, agora personalidade mais solidificada na liderança daquele partido, sublinhando que o seu papel é o de "unir e reconciliar", sustentando ainda que deveria ser formado um "Conselho Nacional na amplitude do Movimento de Unidade Nacional", incluindo "republicanos, monárquicos, militares, anarco-sindicalistas, nacional-sindicalistas". 


E assinala o "Avante" que se referiu "à unidade com os católicos como o passo mais decisivo que falta dar na criação dum amplo movimento de unidade nacional".


Toda esta política táctica, insere-a Álvaro Cunhal no projecto de uma "unidade da Nação para a conquista da Democracia". 


Destacou que a luta contra "a opressão colonial" apenas deveria ser defendida uma "outra política" na gestão corrente das possessões do Ultramar.


Este projecto de "Unidade da Nação" está subjacente na questão de Goa, ocorrida em 1947, quando movimentos separatistas surgem naquela antiga colónia. 


O Jornal "Avante" culpa "O Salazarismo" de afastar "Goa de Portugal". 


Vejamos o argumento rebuscado em toda a sua sequência: "pela sua política antidemocrática e de opressão colonial, o governo salazarista está cavando um irremediável abismo entre Portugal e os povos coloniais".


Curioso é o elogio do mesmo jornal à morte de Paiva Couceiro, um monárquico convicto e colonialista ferrenho, com notícia central de primeira página. 


Eis o título "PAIVA COUCEIRO; inimigo do fascismo", e corpo central da notícia: "As ideias e a acção de Paiva Couceiro nada tinham que ver com as nossas, de comunistas. Mas um ponto comum nos unia: a luta pela defesa da independência e liberdade de Portugal, a luta contra o governo fascista de traição aos interesses do povo e da nação portuguesa". (sublinhando meu). 


Hoje sabe-se que, desde 1952, havia divergências entre a orientação da direcção do PCP e os "jovens coloniais" que nele militavam ou estavam próximos ( o angolano Lúcio Lara e a moçambicana Noémia de Sousa chegaram a participar em reuniões da cúpula daquele partido).


Estas divergências devem ter contribuído para que, em 1957, apenas no seu V Congresso, o PCP tivesse inserido no seu programa o direito à independência das colónias portuguesas.


Mas, o rumo da sua política estava centrado na busca da unidade nacional. 


De certo modo, a grande clarificação dá-se com o início da própria guerra, onde a questão colonial se tornou um dos pontos centrais das divergência surgidas em 1961 no Comité Executivo e levaram à primeira grande cisão "pela esquerda".


É também a guerra, já na parte final, que obriga o recém formado Partido Socialista, em 1973, a defender idêntica posição, precisamente, num comunicado conjunto com o PCP.



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