segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

SÍRIA: HÁ JORNALISMO INDEPENDENTE NOS GRANDES MEIOS DE COMUNICAÇÃO?




1 - Vou falar do chamado "jornalismo de guerra", a propósito da morte de jornalistas que trabalhavam para grandes jornais ocidentais na Síria, e, para tal farei uma "espécie" de declarações de interesses, atendendo a dois pontos:


a) Fui jornalista profissional e estive em países que estavam em guerra; visitei outros, como turista há menos de dois anos, a maior parte dos quais no Magreb e Médio-Oriente, sendo nesta última região, a Síria, (passei, nomeadamente, pela cidade de Homs e visitei um antigo forte medieval das cruzadas, chamado Krak de Chevaliers, tudo isto situado muito perto do Líbano, de onde se avista todo o vale de Homs), durante cerca de três semanas.


b) Fui combatente colonial na Guiné durante dois anos, Janeiro de 1970 a Dezembro de 1971, como membro de uma unidade de força especial da Marinha, percorrendo, praticamente, todo aquele território operacional. 


Nesta altura, estiveram, naquela antiga colónia, jornalistas, incluindo estrangeiros, mas nunca, mesmo nunca, estiveram nos locais de combate efectivo. 


Por duas razões, nós não os deixávamos, e eles não faziam questão de "caminhar no mato". Falavam com as tropas nos quartéis. Quando muito davam uma "voltinha" em redor do arame farpado.


Eu sei que isto mudou um pouco, mas nas frentes de batalha mais "quentes" nenhum comandante gosta de ser visto a realizar o que lhe mandam fazer. A não ser que o "jornalista" esteja em perfeita sintonia com o que se vai efectuar. Concorda, portanto.


2 -  Na Síria, os jornalistas ocidentais entraram no país, com as tropas que fizeram incursões, a partir do Líbano e da Turquia. Entraram, pois, com um dos sectores que estão em confronto. Estão a relatar o que se passa nesse sector, do ponto de vista dos chamados "insurgentes". 


Quem está na guerra, dá e leva, e os jornalistas que estão em acção na região de Homs fazem-no com o apoio dos seus "patrões" dos grandes meios de comunicação social, como foram os casos da jornalista norte-americana Marie Colvin, que trabalhava para o "Sunday Times", do vigarista Murdoch, e Remi Ochlik, fotógrafo do "Paris Match", que recebeu um prémio por imagens captadas na Líbia.


Aldel Hakim Belhaj é o líder histórico da Al Qaeda na Líbia e governador militar de Trípoli - agora é o chefe do Exército Livre Sírio


Onde morreram estes jornalistas?  Segundo a agência britânica Reuters, "numa casa utilizada como centro de imprensa e por militantes anti-regime".


Estavam, justamente, à mão de semear.


Relataram, até agora, os jornalistas da grande imprensa ocidental, nomeadamente norte-americana, britânica e francesa, o que se está a passar na Síria? 


Não. Escreveram a partir das suas fontes, que, aparentemente, os deveriam, proteger. Eles tinham um "campo de informação" escolhido à partida, pelos seus chefes em Londres, Washington ou Paris. 


Quem lê o que o jornalista (ou, muitas vezes, pseudo-jornalistas) deve questionar-se sobre as fontes de informação. 


Eu questiono-me: Se o número de mortos, diários, em Homs, que as agências ocidentais transmitem, a partir de um Observatório sedeado em ...Londres, for de cerca de 40 pessoas, então a cidade já deveria ter perdido mais de 10 por cento da população, em meses de combates, e estaria, praticamente, inactiva face ao elevado número de feridos.


O que é estranho é que não descortino informações das grandes agências internacionais, provenientes de Damasco, ou de Aleppo.


Não estou a por em causa a existência de censura do regime de Damasco, pois ela existe. 


Nem estou a dar apoio directo ao regime de Assad. É um regime idêntico ao da Arábia Saudita. Preciso, aliás, esta afirmação. Não é idêntico. 


É laico formalmente, e não teocrático e fanático com o dos oligarcas esbanjadores Sauds sauditas. Não está é, completamente, alinhado com Washington e capangas de Londres e Paris, embora tivesse servido de "cadeia de retaguarda" dos prisioneiros de Guantánamo dos torturadores norte-americanos.


Pertence a outra aliança geo-estratégica no Médio-Oriente. Apenas isso.


Afirmo que há descontentamento interno. Certo. 


Mas interrogo-me sobre a capacidade militar dos "insurgentes" civis - fardados a rigor com camuflados do deserto made in USA, aliás como na Líbia.


No fundo, quero sublinhar: não acredito nos jornalistas dos grandes meios ocidentais, que estão a acompanhar os "insurgentes" em Homs, com notícias repassadas por Londres (o tal Observatório) e Washington. Os seus patrões não gastam dinheiro nestas guerras, se eles não estiverem a ser veículos de propaganda dos seus interesses.





Às vezes, contam-se as verdades, nos jornais de segundo plano, como o caso do espanhol ABC, que é monárquico. 


Eis uma pequena resenha de uma reportagem do jornalista, que também se afirma fotógrafo Daniel Iriarteque acompanhou os "milicianos" do chamado Exército Livre Sírio 


O jornalista refere na sua reportagem, que aliás é favorável ao derrube de Assad:


O miliciano Brahim está preocupado. "Há um controlo do Exército na entrada da estrada", disse a camponesa, o que significa que as passagens de saída estão cortadas. Nós temíamos algo assim, por isso os raros repórteres estrangeiros decidiram sair da Síria, perante o risco de acabarem presos. 


Mas parece que chegamos tarde. Finalmente, quando anoitece, Brahim encontra uma solução. Arranja três automóveis que, conduzidos, sem luzes, procuram uma estrada alternativa. Após horas de espera, conseguem fazer-nos cruzar as linhas inimigas por outro local. Brahim ri-se, satisfeito: "O Exército Sírio Livre encontrou uma saída!", disse. O "comboio" conduz-nos a uma casa de campo onde nos espera outro grupo que será evacuado connosco. E então temos uma surpresa: tratam-se de três líbios que, nas suas próprias palavras, vieram não para combater, mas sim para "avaliar as necessidades dos irmãos revolucionários sírios". 


Os líbios não ocultam as suas identidades. Tratam-se de homens próximos de Abdelhakim Belhadj, actual governador militar de Trípoli e antigo jadista, ligado à  Al Qaeda .

Um deles é um velho conhecido dos repórteres que cobriram a guerra da Líbia: Mehdi al-Hatari, o antigo comandante da Brigada de Trípoli, que desempenhou um papel fundamental na tomada da capital e na queda de Khadaffi. 



O segundo, Adem Kikli, disse que trabalha para Belhadj, e está há quase duas décadas exilado em Londres.



O terceiro, Fuad, parece ser um guarda-costas. "Estamos aqui por iniciativa própria e pessoal, não por ordem de ninguém", sustenta Adem. E sublinha que Harati renunciou publicamente ao seu posto em Trípoli em 11 de outubro passado. 


Adem, além disso, afirma que esteve com outros líbios, "algumas dezenas", que se deslocaram para a Síria por sua conta para ajudar os insurgentes.

Harati, não há dúvida, é um homem de acção. O homem mudou de campo, após participação na Frota de Gaza na Primavera de 2010. "Fui ferido no assalto ao Mavi Marmara, e estive nove dias num cárcere de Tel Aviv", conta-nos. 


Em Fevereiro, Harati, que vive em Dublin e tem passaporte irlandês, despediu-se da sua mulher e filho e, junto com outros líbios exilados na Irlanda, dirigiu-se à Líbia. Ali criou a Brigada de Trípoli, um grupo de guerreiros de elite, treinados por assessores do Qatar, que combateu ferozmente na batalha final pela capital.

ABC, constatou, além disso, a sua presença em locais, como Bahrein, Sudão e Ancara, com propósitos não-esclarecidos. 



Há pouco, Harati  viu-se implicado num estranho episódio, quando, segundo seu relato, uma quadrilha de ladrões lhe assaltou a casa, roubando muitas jóias e 200.000 libras esterlinas (uns 238.000 euros). 


Harati disse à Polícia que uma grande quantidade de dinheiro lhe havia sido entregue por um agente da CIA para financiar a luta de seu grupo contra Khadaffi. 


O combatente deixou essas 200.000 libras à sua mulher, caso lhe sucedesse algo, e o resto levou-o com ele para a Líbia.

Enquanto fugíamos em direcção à fronteira, os líbios foram dando algumas dicas sobre a sua presença na Síria. 



"Se dependesse de nós, enviaríamos as armas para os sírios, já amanhã. Nós já não necessitamos mais", explica Harati. 


"Mas teriam de entrar pela Turquia, e os turcos não podem autorizar porque não há consenso dentro da NATO", sublinha. 


Já na fronteira, os três líbios dizem que regressam à  sua pátria. Pelo menos, disseram que sim.


3 - Não esqueçamos o 25 de Abril em Portugal. Quando nas sedes dos governos ocidentais, em particular de Washington, Paris, Bona e Londres, tocaram as campainhas de que poderia haver um "governo de esquerda" no país, apareceram por cá uma "chusma" de "repórteres". 


Como também entraram no país, quantidades enormes de "correspondentes" de Leste, desde a antiga URSS até Cuba, por vezes, por interpostos "exilados".


Conheci muitos, soube do que alguns estavam a fazer realmente no terreno, como Martha de la Cal, recentemente falecida



domingo, 26 de fevereiro de 2012

EUA/IRÂO: VÃO HAVER MUDANÇAS GEO-POLÍTICAS?



      


  1 - Algo está a mudar nas declarações dos principais intervenientes na geopolítica do Médio-Oriente e Mar Cáspio, nas últimas semanas.


A mais importante, para mim, é a do chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas norte-americanas, general Martin Dempsey, que sublinhou, há dias, que o seu parceiro de confronto económico-geo-estratégico na região, o Irão", é um "actor racional", argumentando que - para ele, estratega político-militar norte-americano - "não está claro" que o regime iraniano "vai fazer uma bomba (nuclear) e com base nisso", precisou: "acho que é prematuro decidir exclusivamente que o tempo de uma opção militar chegou".


Nesta sequência, surgiram afirmações das agências dos serviços secretos norte-americanos a tocarem na mesma tecla. Não existe qualquer prova de que o Irão esteja a avançar para um programa nuclear militar. O mensageiro é o insuspeito jornal New York Times, um jornal do lobby judeu americano.


É estranho? Não é?


É que, por detrás do Irão, estão várias componentes, as mais importantes económicas (hoje, aquele país é um potentado energético), depois as relações militares estão a sofrer mudanças importantes (o militarismo norte-americano está a asfixiar a economia do seu próprio país), e, em terceiro, as intervenções das grandes potências nucleares, Rússia e China, estão, ainda que momentaneamente, em rota concorrencial com os Estados Unidos da América, face à importância geo-estratégica das matérias-primas primordiais do Mar Cáspio.


Um quarto ponto, talvez o mais significativo, no presente: a crise síria está a "gerir um número muito maior de condicionantes do que existíam no caso líbio", numa confissão, desenvergonhada, do ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, William Hague.


Finalmente, mas apenas como um aparte, o capital judeu sionista de Israel está a perceber que o seu isolamento é maior do que supunha. 


E os dirigentes sionistas do Estado israelita, como o Primeiro-Ministro, Benjamin Netanyahu, e o ministro da Defesa, Ehud Barak, que, há meses, pressionavam, com todos os pretextos possíveis, para a efectivação de um ataque ao Irão, sentem que o "chão" lhe está a fugir. E pedem contenção.


Na quarta-feira, no jornal do lobby judeu norte-americano New York Times, Efraim Halevy, ex-chefe máximo da MOSSAD, adverte para o perigo, que representa, neste momento, e isto no que diz respeito à sobrevivência de Israel, um ataque aos complexos industriais nucleares do Irão.


E, porquê, na perspectiva deste chefe-mor da secreta israelita, uma eventual movimentação "descontrolada" contra a Síria, revolucionaria tudo à sua volta.


(Curioso, para quem goste de analisar estas coisas, os chineses estão a construir, neste momento, uma das maiores auto-estradas de Israel!!!).



2 - Significam estes indícios que o assalto imperialista ocidental aos mercados energéticos do Médio-Oriente e do Mar Cáspio irão diminuir. 


Penso que não. Ir-se-á refinar porque as rotas das energias (oleodutos e gasodutos) estão a sofrer alterações de vulto, de maneira evidente na área do Mar Cáspio.


Há reformulações geo-estratégicas, possivelmente, até de alianças naquela região do mundo, que apontam que, possivelmente, neste ano, vamos assistir a mudanças drásticas em toda a região.


A chamada "Primavera árabe" está a trazer mais dores de cabeça para o Ocidente, Rússia e China, do que pensaram quando estimularam os "movimentos internos" desde Marrocos até à Síria.




Quer na Túnísia, quer no Egipto, as eleições foram ganhas por forças políticas religiosas, construídas, essencialmente, em torno das chamadas "Irmandades Muçalmanas", que, na prática e como se pode ver no terreno, foram financiadas pela Arábia Saudita.


Embora, esta última seja uma aliada de Washington, tem também uma agenda própria, agenda esta que está muito ligada à sua tentativa de sobrevivência como regime teocrático e ditatorial na região.


Mas, também ganharam protagonismo forças político-religiosas, como os salafitas, que estão muito ligados ao Irão. Há, nesta contenda, uma potência nascente regional muçulmana, que é a Turquia, que pretende interferir em toda a região (muitos dos povos com os azeris e os iugures, entre outros, têm uma ligação aos turcomanos), mas surgem, como potência, com um óbice para os seus correlegionários, quer sejam sunitas ou xiitas. Está ligada à NATO e aos norte-americanos.


Todavia, a crise na Síria e a presença crescente naval na região do Irão, por um lado, e da Rússia e China, por outro, na região (não esquecer que o governo chinês tem 25 navios de guerra entre a Somália e o Golfo Pérsico!!!), embaraçou a Turquia, e, isto porque a intervenção turca no interior do território sírio já levou à captura de perto de 100 "homens das tropas especiais" de Ancara, sendo que, na sua maioria, segundo a imprensa local, pertencem aos serviços secretos.


Ora, a passagem e presença de navios de guerra iranianos ao longo da costa mediterrânica, que abrange a Síria, Israel e a própria Turquia, é um sinal dado por Teerão de que uma nova potência - ainda que regional e incipiente - está a dar a cara aos seus possíveis concorrentes.


Um alto político iraniano foi muito explicítico (embora com alguma dose de demagogia): a presenças de esquadras navais da Rússia e do Irão, quer no litoral líbio-egípcio, quer na Síria "é uma mensagem forte contra qualquer possível aventureirismo dos EUA".


"No caso de os EUA cometerem qualquer erro estratégico na Síria, há real possibilidade de que o Irão, a Rússia e vários outros países ripostem com força esmagadora contra os Estados Unidos", acrescentou o mesmo político.


Este é que é o busilis da questão: Quem cometer um erro - passagem da diplomacia para a guerra, não se terá uma percepção, no imediato, quem terá os estragos mais elevados e quem necessitará de empregar mais meios militares e mais violentos. 


A prazo, sabe-se que os EUA poderão vencer. 


Mas, antes desse prazo, poderão ficar sem homens para levar para a frente, e aqueles que estão em países ocupados da zona poderão perder os "laços" hierárquicos com o centro, Washington. 


(Quem esteve na guerra colonial na Guiné sabe, de experiência própria, como o general Spínola teve de abandonar a guerra, de calças na mão, em 1973, porque as tropas já não lhe obedeciam).


Claro que a Rússia joga aí com a sua habitual política de duas faces: não quer a presença maciça ocidental, mas também pode deixar cair os seus aliados ocasionais, como o Irão e a Síria, em troca de vantagens de "ascensão" na liderança mundial.


A questão, todavia, do ponto de vista geo-estratégico-militar, é o precedente que se criou.


Na realidade, as águas marítimas do Mediterrâneo magrebino na última década e do Mar Negro e Golfo Pérsico eram um "quintal" das forças ocidentais, capitaneadas pelos EUA, que, com uma simples ameaça, obrigava os seus potenciais oponentes a conterem-se nas movimentações e exercícios militares.


Hoje, o Irão, que foi martirizado, entre 1980 e 1990, por uma guerra conduzida pelos EUA, por interposta personagem que abandonaram, Saddam Hussein, do Iraque, faz zarpar parte da sua esquadra pela costa mediterrânica junto a Israel e faz questão de enfrentar - ainda que em palavras, mas não só - a única potência militar exterior à região os EUA.


Tempos atrás, o Egipto, fiel submisso a Washington e em concluio com Israel, impedia a passagem de navios de guerra iranianos pelo Mar Vermelho. 


(As autoridades político-militares do Egipto vão levar a julgamento um conjunto de "cooperantes" de ONG (Organizações Não Governamentais) norte-americanas a operarem naquele país, que interferiam e organizavam as "manifestações" anti-governamentais).


Desde a queda de Mubarak, a Marinha de Teerão já navegou duas vezes pelo Canal do Suez.


A propósito da crise na Síria, é real que a influência, quer da Rússia, quer do Irão, aumentou na região.


Naturalmente, em território sírio, estão "conselheiros iranianos", como também devem estar russos e chineses. 


Os Estados Unidos (e Israel) temem certamente este avanço, que poderá ser maior, com uma internacionalização crescente do conflito. 


Temos de nos inquirir: qual a razão, porque o Egipto "abre mãos" da sua antiga hostilidade ao Irão? 


Será porque as forças da "Irmandade Muçulmana" estão demasiadas ligadas à Arábia Saudita? Ou será que pretende "rever" a sua "asfixia" pelos norte-americanos? Porque será que o comando militar que governa o Egipto atira com "as culpas para mãos estrangeiras" face à continuidade das movimentações populares no país?  Porque será que a Irmandade Muçulmana, vencedora das recentes eleições legislativas, ameaçou rever o Tratado do Sinai, assinado em 1979, por Sadat e Beguin, com a intervenção do ex-Presidente dos EUA Jimmy Carter?


Os indícios apontam para novas relações geo-estratégicas na região.


3 - A crise capitalista financeira de 2008 trouxe repercussões imediatas nos Estados Unidos, e por arrasto, em quase todo o mundo capitalista mundial, incluindo a China, como estrutura económica de capitalismo de Estado.


No confronto concorrencial, que se estabeleceu no mundo, o centro financeiro de Wall Street, em cumplicidade directa com a City Londrina, e os seus capatazes governamentais ingleses (conservadores e trabalhistas) virou-se para a União Europeia, a potência económica mundial em ascensão, com a moeda mais poderosa e atractiva. 


Esta UE, com pés de barro na sua componente militar e diplomática, e na sua autonomia financeira, sofreu - e ainda sofre - uma dos mais ferozes e concentrados ataques de morte entre grupos capitalistas, que se dizem aliados e amigos do peito.


Concorrência, certo, mas também conjução para se salvar do descalabro.


Eles estão, de um lado e doutro, na mó de cima, estão a controlar toda a crise que se abateu sobre eles, e eles fazem-no sentir sobre as classes exploradas, mas abriram a caixa de pandora: houve uma mudança radical nas relações inter-capitalistas.


Os EUA tiveram de retrair a sua ânsia imperialista feroz, minados por uma debilidade que está a vir, novamente, ao de cima, no seu sistema financeiro. 


Mas, tal não significa que a voracidade do complexo industrial-militar não empurre os representantes políticos para a guerra, como forma de "avançar no meio dos destroços". Todavia, os tempos estão a mudar.


Seria exaustivo, neste texto, desfiar a situação actual do sistema bancário e segurador nos EUA, que pode ser consultado nos resultados dos próprios bancos, bem como nos relatórios da Secretaria do Tesouro e até da Reserva Federal (FED).


Estão, em certa medida, a virar-se para dentro, para uma certo proteccionismo comercial, ao mesmo tempo que os países capitalistas, chamados emergentes, como a Rússia, China, Índia, Brasil e Paquistão adquirem uma projecção maior nas actividades do capital e do comercial mundial


E nesta conjuntura é que se deve analisar a evolução da União Europeia. Ela resistiu, como entidade económica capitalista, pois teve a flexibilidade suficiente para ultrapassar as suas dificuldades institucionais. O seu incremento futuro irá ser ditado, pela modificação total da capacidade de se modernizar em democracia.


Mas, também foi na UE que os mecanismos de auto-defesa e mudança se produziram, porque o poder económico (e certamente político) sentiu que, por detrás desta pressão, está a possibilidade de uma forte contestação popular.








Infelizmente, esta contestação é fragmentada, e não está apoiada num programa político estruturado de ruptura.


O atraso entre a teoria e "praxis" é grande, como grande é a ausência de uma organização supracional europeia revolucionária.


Os tempos vão determinar o que vai surgir: fascização, democracia ou revolução. E a Europa é o centro de toda esta capacidade de mudança.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

UMA PEQUENA PASSAGEM PELA ACTIVIDADE DO NOVO CARDEAL PORTUGUÊS










1 - Os grandes meios de comunicação social portugueses embandeiraram em arco com a nomeação, recente, de um hierarca religioso de origem português para ocupar o cargo de cardeal da Igreja Católica Apostólica Romana. O senhor chama-se Manuel Monteiro de Castro.

Ficamos a saber que é um homem da diplomacia do Vaticano, ou seja, um profissional de carreira no interior da Santa Sé, conhecedor dos negócios mundiais da Igreja Católica Apostólica Romana. 


Na biografia oficial distribuída pelo jornal papal "L`Observattore Romano", assinalam-se alguns locais da sua passagem: "Panamá, Guatemala, Vietname, Austrália, México, Bélgica, Caraíbas, El Salvador, Honduras, África do Sul e Espanha, onde permaneceu entre 2000 e 2009; foi também observador permanente do Vaticano na Organização Mundial do Turismo".


Qual será a razão porque uma Igreja dita espiritual necessita do "turismo"?


Naturalmente, para sacar dinheiro, que é um valor muito material. E quem visitar o Vaticano poder viver "in loco" o frenesim monetário, naquele sector, dos negócios "sagrados" da Santa Sé.


Desde a Capela Sistina à mais simples vela. Tudo em nome da Fé, da Fraternidade, da Solidariedade....das "esmolas" papais.


E claro a Santa Sé sabe, perfeitamente, de toda a poda, pois, ela, com o seu sentido espiritual e desinteressado do materialismo, está no topo dos negócios do capitalismo internacional, (legais e ilegais) através dos seus bancos, das suas empresas transnacionais, das suas vigarices bolsistas.

A Manuel Monteiro de Castro  - convém referir que se passeia pelos *corredores do Vaticano* desde 1961 -
deram-lhe um cargo de "penitenciário-mor da Santa Sé", e acrescenta-se, na sua biografia oficial, que a representou "em muitos congressos e conferências a nível mundial". 


Como penitenciário-mor, presidente de um tribunal que, na Idade Média e Moderna, tinha um poder repressivo enorme, hoje, em termos mais suaves, ele dedica-se a conceder as absolvições, as dispensas, as comutações, as sanções, as remissões e "outras graças". 


O alemão Martinho Lutero, no século XVI, rompeu com a Igreja de Roma, devido, justamente, em outras razões, ao papel material negocial que as indulgências e dispensas representavam no engrossar da corrupção material da Santa Madre Igreja Romana.


Em termos práticos, elas significam, ainda hoje, uma canalização muito grande de dinheiro para os cofres do Vaticano.


A finalizar esta introdução semi-errática sobre a vida e actividade do novo cardeal um pequeno apontamento: o lugar onde nasceu e viveu nos seus primeiros tempos de iniciação como ser pensante - a aldeia de Santa Eufémia de Prazins, no concelho de Guimarães. Na parte final, faremos a conexão.  


2 - Falemos agora na sua ideologia e maneira de pensar.


Como cardeal, que a biografia do jornal papal faz questão de  referir que se destacou em "defesa dos mais fracos", ele falou directamente para os portugueses, em entrevista inserido no jornal Correio da Manhã", e analisou, justamente, o papel da mulher.  


 "A mulher deve poder ficar em casa, ou, se trabalhar fora, num horário reduzido, de maneira que possa aplicar-se naquilo em que a sua função é essencial, que é a educação dos filhos", defendeu Manuel Monteiro de Castro, considerando que existe falta de apoio do Estado à família. Um problema em Portugal.



Ao Jornal de Notícias, o cardeal, de 73 anos, que, certamente, dedicou imenso tempo às suas obrigações familiares, como celibatário, sublinha: "devíamos dar muito mais valor à família e ao valor da mulher em casa. O trabalho da mulher a tempo completo, creio que não é útil para País". 


"Trabalhar em casa sim, mas que tenham de trabalhar pela manhã até à noite, creio que para um País é negativo. A melhor formadora é a mãe, e se a mãe não tem tempo para respirar como vai ter tempo para formar", sublinhou no seu douto pensamento.


Realmente, em primeiro lugar, é de uma grande desfaçatez, um hierarca de uma entidade que se reclama, acima de tudo, do espiritual, imiscuir-se nos assuntos materiais e sociais de uma sociedade, que eles rejeitam.


Em segundo de um cinismo a toda a prova, pois eles escolhem o celibato, exactamente como acto consciente de abandono da sua condição de dar apoio à constituição e criação de uma família.


Em terceiro lugar, como pode um hierarca que, como seguidor do cristianismo, menospreza os direitos humanos e as relações sociais comunitárias, emitir palavras piedosas em sentido contrário.


Cito, para conste as orientações de Jesus Cristo, retiradas do Evangelho de Mateus:


"Se alguém me reconhecer diante de todos como seu amigo, abertamente o reconhecerei como meu amigo diante do meu Pai no céu. Mas se alguém me negar publicamente, eu o renegarei publicamente diante do meu Pai no céu. Não julguem que vim trazer paz à terra! Não, antes vim trazer conflitos(sublinhado meu). De facto vim para lançar um homem contra o seu pai, a filha contra a mãe, a nora contra a sogra.


Os piores inimigos de um homem estarão justamente dentro  da sua própria casa! Se amarem mais o vosso pai e mãe do que a mim, não merecem ser meus; se amarem o vosso filho ou filha mais do que a mim não merecem ser meus. (Mateus, pag. 24, O Livro, Publicações Europa- América, 1981)

3 - Finalmente, e procurando interligar a naturalidade do novo cardeal com a similitude de nascença dos principais hierarcas da Igreja Católica portuguesa, faço uma pequena incursão, em parte do seu *BI*, do conjunto de bispos católicos portugueses, que sejam titulares de uma diocese, ou seja, em termos práticos, que exerçam a carreira activa dentro da hierarquia da sua confissão religiosa.

Existem, geograficamente, 20 dioceses, e um bispo diocesano para as Forças Armadas, que se intitula, na liturgia, Ordinariato Militar. 


Curiosamente, é este último, de nome Januário Torgal Ferreira, que ostenta igualmente o posto de major-general ou contra-almirante, o único bispo titular actual que nasceu numa grande cidade, Porto.


Todos os restantes nasceram em aldeias, de onde vieram, posteriormente, para seminários, onde se formaram.


Citamo-los, com as suas naturalidades:


Vila Real - Amândio José Tomás, nascido em Cimo de Vila da Castanheira, Chaves;


Viana do Castelo - Anacleto Cordeiro Gonçalves de Oliveira, natural de Cortes, Leiria;


Portalegre-Castelo Branco - Antonino Eugénio Fernandes Dias, Longos Vales, Monção;


Leiria-Fátima - António Augusto dos Santos Marto - Tronco, Chaves:


Angra do Heroísmo - António de Sousa Braga, Santo Espírito-Vila do Porto, Ilha de Santa Maria;


Aveiro - António Francisco dos Santos, Tendais, Cinfães;


Funchal - António José Cavaco Carrilho,  S.Clemente de Loulé, Loulé;


Braga - Jorge Ferreira da Costa Ortiga, Brufe, Famalicão;


Beja - António Vitalino Fernandes Dantas, Oleiros, Vila Verde;


Porto - Manuel José Macário do Nascimento Clemente, S.Pedro e S.Tiago, Torres Vedras;


Setúbal - Gilberto Délio Gonçalves Canavarro dos Reis, Barbadães de Baixo, Vreia de Bornes, V.Pouca de Aguiar;


Viseu - Ilídio Pinto Leandro, Rio de Mel, Pindelo dos Milagres, S.Pedro do Sul;


Lamego - Jacinto Tomás de Carvalho Botelho, Prados de Cima, Rua, Moimenta da Beira;


Lisboa - José da Cruz Policarpo, Alvorninha, Caldas da Raínha;


Évora - José Francisco Sanches Alves, Lageosa, Sabugal;


Bragança-Miranda - Manuel Garcia Cordeiro, Vila Nova de Seles, Angola;


Algarve - Manuel Neto Quintas, Mazouco, Freixo de Espada à Cinta:


Santarém - Manuel Pelino Domingues, Lentisqueira, Mira;

Coimbra - Virgílio do Nascimento Antunes, São Mamede, Batalha;


Guarda - Manuel da Rocha Felício, Mamouros em Castro Daire. (fonte Anuário Católico).


4 - Vive esta hierarquia e a respectiva entidade religiosa das "esmolas" e dos peditórios feitos às saídas ou entradas das respectivos edifícios de culto?

Não, a Igreja Católica portuguesa é uma instituição muito rica, cujos valores patrimoniais, financeiros e negociais são desconhecidos. Pode dizer-se que vive, realmente, na abundância.

Na realidade, através das dioceses e paróquias, essa Igreja controla, com entrada fresca de dinheiro dos utentes e subsídios estatais, uma parte substancial da assistência social, da saúde pública, da educação, e rendas não especificadas de valores patrimoniais e empresariais.

Pela Concordata de 2004, tem acesso, ainda, a benefícios e privilégios específicos, que, aliás, outras confissões não têm.

Além de valores astronómicos que recebem, cada ano, do Orçamento de Estado para as IPSS, na esmagadora maioria no âmbito da sua gestão, controlam o que eles consideram ser "Obras de Acção Social", que enquadram creches, jardins infantis, escolas básicas e ATL. ( Estes são 1754 no país, segundo o Anuário Católico).

São proprietários de 164 escolas católicas. Igualmente gerem 360 "Centros da Vida Cristã), que comportam Casas de Retiro, Capelanias e Santuários. Tem na sua dependência 99 Institutos Religiosos Femininos e 17 Masculinos, bem como Institutos Culturais (desde Bibliotecas a Museus).

De referir, a terminar que controlam uma parte significativa da comunicação social em Portugal, com 539 jornais, revistas, boletins, rádios, editoras, tipografias e livrarias. (Fonte Anuário Católico).

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

EUA: EXPLOSÃO SOCIAL E RAZIA BANCÁRIA?


1 - O capitalista judeu norte-americano George Soros, uma das eminências principais do sistema especulativo mundial, centrado em Wall Street, afirmava, a 24 de Janeiro último, à revista Newsweek, ela própria nas mãos do lobby judeu, que havia a possibilidade, nos tempos mais próximos, do colapso do sistema económico mundial.
Pode surpreender-nos, como um paradoxo, esta frase desse explorador, ele que tem sido dos capitalistas que mais tem ganho com a especulação desenfreada, que está estabelecida a nível mundial, desde o surgimento da crise financeira global de 2007.

Claro que Soros tem perfeita noção, que, no momento presente, esse colapso não está eminente, mas procura criar pânico e medo entre as classes exploradas, aconselhá-las ao imobilismo, para que não surjam nas ruas os slogans e movimentos que serão então inquietantes, e, prenúncio, quando vierem a ser, realmente, soltos e colocados na ordem do dia de "combate ou morte", estaremos em trabalho de parto de uma sociedade nova.

Eu penso que, apesar da crise, sem precedentes do sistema capitalista na actualidade, ainda não estão criadas as condições para uma sublevação societária. 

Há, no entanto, sintomas. É verdade. 


O futuro - talvez mais próximo do que estejamos a magicar - o irá determinar.

Para que as classes trabalhadoras possam ter capacidade de efectuar a sua própria libertação, terá de haver uma conjugação a seu favor entre o domínio da relação produtivas e as relações sociais. E, nesta interligação, a mais importante é que as classes laboriosas se tornem, elas próprias, como o centro da acção. 

Quer isto dizer, sejam classes revolucionárias no sentido político do termo.



Clique aqui para ver o gráfico em tempo-real sobre Bank of America 1 Ano


















evolução das acções do Bank of America em 2011


2 - Nas declarações de Soros à Newsweek, o especulador sustenta que o Mundo enfrenta um período "malévolo" e pede à Europa para lutar para evitar "cair no caos e no conflito".


Mas, qual a razão desta preocupação de um magnata que tem lançado o "caos" financeiro para sacar mais valias bolsistas, enormes mais valias, que se apressa a esconder em off-shores e/ou a colocar em produtos chamados fundos de investimento, anónimos, altamente rentáveis e inúteis, de que ele e outros semelhantes são os principais detentores, quer a nível de empresas financeiras, quer em conjugação com os bancos?


Porque ele está interessado que aumente a dívida pública (e absorva a privada, principalmente), porque ele sabe que isso satisfaz, principalmente, a horda burguesa capitalista financeira, onde ele se insere, pois ela com o afundamento constante do défice estatal se torna na fonte principal do seu enriquecimento.


Pois, ele sabe que, que no sistema legislativo e executivo norte-americano, quer no europeu, os seus (deles especuladores) representantes transferem o dinheiro sacado aos contribuintes, cada vez mais e em maior quantidade, para o sistema bancário a juros da ordem da "uva mijona", que depois colocam na especulação a preços mais elevados, que o próprio Estado terá de suportar a juros de agiotagem. 


Mas então porque fala no perigo do "caos" e do "conflito"?


Porque a situação da especulação está a chegar aos limites da bancarrota. 


E não propriamente, na pequena Grécia, mas sim, porque os indícios da economia política, apontam para uma provável "implosão" em alguns dos principais bancos mundiais, que estão situados, justa e principalmente, no centro do seu sistema especulativo, Wall Street.  


Uma realidade: em 2011, assistiu-se a um afundamento do valor das cotações de grandes bancos, como o Bank of América (ver gráfico acima).


 Por seu turno, o Morgan Stanley anunciou em Dezembro passado, que em quatro departamentos de Nova Iorque irá despedir, pelo menos, 589 funcionários, e anunciou aos seus trabalhadores que encara a possibilidade de cortar cerca de 1.600 empregos em todas as regiões geográficas e em vários níveis hierárquicos.


Explicação: razões económicas, devido a quedas astronómicas nas receitas de banco de investimento e actividades comerciais.



Analistas admitiram que o banco teve um prejuízo profundo no quarto trimestre de 2011, devido a um negócio pouco claro em que terá de despender de 1,8 mil milhões de dólares com um acordo com a seguradora MBIA.


A projecção de receita total é de 6,48 mil milhões de dólares, segundo a Thomson Reuters I/B/E/S, o que significa que está a a haver uma queda de 25 por cento por ano, e já há vários anos.



Também em Dezembro, o Citigroup anunciou o corte de 4,5 mil postos de trabalho no mundo. Mas admitiu que possam ser muitos mais. 


Refere a revista brasileira Veja, de Dezembro, que o Citi  junta-se a outros bancos mundiais nos cortes de postos de trabalho, mais de 120 mil, uma vez que reguladores impuseram normas mais rígidas de capitais e a economia continua fraca. 


As demissões envolverão as unidades próprias de actividades comerciais, que estão sendo reduzidas.



Mas esta perspectiva de razia sombria nos grandes bancos norte-americanos, pode alastrar-se a outros países, que procuram "esconder" esta realidade, com notícias bombásticas e continuadas sobre a União Europeia, caso do Reino Unido (o Lloyds está pelas ruas da amargura, bem como O Deustche Bank (Alemanha) e a Société Générale (França).


Quem está, realmente, no "caos" é o dólar ou o euro? 


Devemos centrar-nos nos próximos nos ventos que sopram dos Estados Unidos.


3 - Ora, chegamos à verdadeira preocupação de Soros: os "confrontos nas ruas dos Estados Unidos".


A questão é real. Mas pode ser mais abrangente. 


As perspectivas apontam para um despertar da cólera, um pouco por todo o Mundo, desde a Europa à China, passando pela própria Rússia, e seguindo mesmo para a Índia e Brasil.


A agitação eleitoral, que vai percorrer grande parte do chamado mundo ocidental - França, Grécia, Estados Unidos da América  - e mesmo fora, passando por vários países do Médio-Oriente, poderá servir para fazer aumentar a consciência de que os povos assalariados espoliados pela agiotagem do capital financeiro.


Mas, também estará em jogo, com as mudanças económicas, que podem surgir, transformações geo-estratégicas de grande envergadura, que poderão fazer aumentar a tensão internacional, a que não estarão alheios as conquistas e reformulação de alianças em torno dos chamados grandes espaços da energia, em especial mo Médio-Oriente e no Mar Cáspio, que trataremos num outro artigo.