terça-feira, 29 de março de 2016

REFLEXÕES SOBRE UMA CRISE MUNDIAL QUE QUER UMA SOLUÇÃO

1 – O que está a suceder, nos últimos meses, na Síria e também no Iraque, deve ser analisado e interpretado em ligação com a evolução dos acontecimentos mundiais desde a crise financeira e económica capitalista desde 2007/2008.

Em meados de 2015, a Síria estava no limiar da fragmentação total, destruída pela cupidez norte-americana que não teve pejo em lançar o caos no país para substituir o actual regime por governos *fantoches* formados por diferentes facções de *combatentes da liberdade* jihadistas que lhes permitiriam, através de *feudos* menores, rapinar e controlar as riquezas minerais, em especial o petróleo e o gás para as multinacionais petrolíferas, ligadas ao capital de Wall Street.


O Iraque, onde os Estados Unidos da América foram o invasor e ocupante em nome da sua *liberdade* e dos seus * direitos humanos*, destruidor do país desde 2003, ficou destroçado, ensanguentado, desarticulado, entregue, em grande parte do território, aos jihadistas wahbadistas, enquadrados, militarmente, por antigos quadros militares do regime de Saddam Hussein, tranvestidos, agora, de apologistas do EI.

No fundo, parecia que o rumo traçado pelos EUA para o controlo económico e geopolítico da região com o retalhamento dos países produtores petrolíferos iria dar novo alento aos objectivos norte-americanos de retomar a sua supremacia sobre as outras potências.

Ora, em poucos meses, a Rússia intervém directamente na Síria, e, indirectamente, no Iraque, em parceria militar com o Irão e o Hezbolá libanês, e, as debilidades económicas e castrenses norte-americanas vêem ao de cima. Um sinal de decadência evidente do sistema capitalista norte-americano, e, por tabela dos seus congéneres ocidentais.

E a Rússia fortaleceu-se, militar e economicamente.

2 – De certo modo e em certo sentido, é esse o sentimento que existe nas classes dirigentes em Washington. O capitalismo financeiro sediado em Wall Street está a perder o controlo sobre o seu sistema político.

E, no âmbito geoestratégico, o controlo da sua ponta de lança militar-imperial, a NATO.

A «cavalgada sem freio» em direcção ao Magreb, Próximo e Médio-Oriente da chamada *aliança ocidental* por terras do Afeganistão, Iraque, Síria, Líbia, Somália, Sudão, está em banho-maria, mesmo em retrocesso, com os +aliados+ europeus dos Estados Unidos, em retirada, deixando o seu parceiro, a gesticular sobre a falta de empenhamento daqueles.

Na realidade, mesmo na Europa, sendo mais precisos na União Europeia (UE), os governos deram como tarefa à NATO, nesta longa crise de refugiados que a percorre, a *fiscalização*... das águas costeiras no Mediterrâneo.


Nem se fala, nem é pedida, na vaga de atentados que atinge vários membros europeus da NATO, a *solidariedade* desta instituição.

A obsessão dos EUA é a Europa. Mas, a UE já não olha para Washington.

Aqueles procuram, por todos os meios, segurá-la firmemente nos braços da sua dependência do capital financeiro de Wall Street.

Por isso, brandem, através de ponta de lanças estribados em declarações de generais, senadores, ou mesmo de candidatos às próximas eleições presidenciais norte-americanas, o «perigo» que vem da Rússia. 

Falam mesmo, com palavras evasivas, em possível «invasão» iminente dos Exércitos de Moscovo.

E isto, porque, uma realidade nasceu e proliferou, apesar de tudo, com a Comunidade Económica Europeia: a necessidade de maiores territórios para o alargamento comercial em espaços maiores, sem entraves alfandegários e fronteiriços.

E o complemento desse alargamento passará por território russo.  

Eis, portanto, o busílis da questão.

(A ameaça de cessão do Reino Unido da UE – a quinta coluna dos EUA - e o fluxo descontrolado de refugiados deve ser enquadrado neste problema).

O avanço da CEE para UE é, simultaneamente, do interesse das suas burguesias, mas também das classes trabalhadoras.

Porque será essa grande Europa, que é historicamente o centro das grandes transformações sociais e revolucionárias, que em caso de novas convulsões, poderá contribuir para lançar os germes de uma nova sociedade.

3 – A evolução do capitalismo financeiro está a bater num muro, em que o outro lado já não tem a continuidade no modelo específico ocidental. 

O capitalismo financeiro atingiu dimensões mundiais com vários centros de decisão. 

Em concorrência feroz de interpares. 

Estes novos centros também estão a patinhar com muros e sem caminho estabelecido.

A UE, apesar da crise, permanece, com o euro a servir de farol para as novas transacções mundiais.

Os BRIC´s procura lançar a sua moeda como unidade de troca e de financiamento transnacional à revelia do dólar e de Wall Street.



Existe desorientação real nas superestruturas capitalistas. Porque as suas economias estão em derrapagens, sem se ver uma luz ao fundo túnel.

Na actual fase da evolução societária, existem condições materiais para uma ruptura de onde pode vir a surgir uma nova sociedade.

São factos indicativos evidentes desde a crise económico-financeira do capitalismo de 2007/2008, que permanece e se tem aprofundado desde então: Será escusado tentar esconder estes factos – as forças produtivas materiais societárias estão em contradição com as actuais relações de produção existentes
  
Estamos em época, mais ou menos prolongada, de revolução social?

Apontamos para isso, e, esses indícios vem justamente do centro capitalismo internacional, por excelência, os EUA.

Esse indício vem, precisamente, da sua superestrutura política.

A campanha eleitoral presidencial naquele país centra-se, a nível de ideias, entre o candidato republicano Donald Trump que defende a fascização do poder estabelecido e o candidato Bernie Sanders, que preconiza *a salvação* do mesmo através do *socialismo*, ou seja de um poder de compromisso classista chamado *social-democracia*.

Como vai ser essa ruptura política ou asfixiamento por métodos violentos, os próximos tempos o vão determinar.

A questão principal para uma nova sociedade vai depender do papel prático que as classes trabalhadoras vão desempenhar nos próximos anos.



terça-feira, 15 de março de 2016

REBELO DE SOUSA: O NOVO MESSIAS DO REGIME

1 – Através dos grandes meios de comunicação social, o actual Presidente da República de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, foi elevado ao estatuto de *Messias*, o salvador da Pátria, fazendo acreditar que a sua ascenção ao cargo, que vai desempenhar, é obra de um indivíduo especial com um carisma fora do normal que o impulsiona para desempenhar uma missão  sem paralelo na História de Portugal.

Rebelo de Sousa representa interesses, representa classes sociais, e, no caso presente, ele surge como o *candidato do regime* que não teve qualquer oponente de ruptura com esse regime.



Ele pretende, pois, exercer o cargo para sustentar um regime que está em perigo. 

Que o seu antecessor contribuiu para fazer com que o descrédito desabasse sobre ele. 

Rebelo de Sousa vestiu, portanto, novas vestes. 

Procurou, e procura, transvestir-se em Messias, o amigo de todos, o homem dos consensos, o reformador do regime.

A sintonia do regime com Marcelo está, pois, em sintonia dos seus órgãos de comunicação social.

Todos os candidatos – mas todos, desde Mariza Matias (BE) a Edgar Silva (PCP/CDU) – se enquadraram na defesa da Democracia e da Constituição.

Ora, Rebelo de Sousa é um dos artífices da actual Constituição e do seu conteúdo classista burguês.

As revisões constitucionais desde 1976, todas elas, foram feitas para legalizar as estruturas económicas do capital financeiro, que domina hoje todas as esferas do Estado português. 

Nelas pontificou, precisamente, o professor de Direito Constitucional Marcelo Rebelo de Sousa.

2 – O *messianismo* marcelista é exactamente o mesmo que elevou Cavaco Silva à liderança do PSD em 1985, com o apoio directo e entusiástico de Marcelo Rebelo de Sousa, que fazia parte da chamada tendência *Nova Esperança*, com José Miguel Júdice, Durão Barroso e Pedro Santana Lopes.


Era na altura esta *Nova Esperança*, o centro ideológico de combate à então Constituição e, principalmente, ao governo de coligação PS/PPD/PSD,  que estava na fase de adesão à CEE, que, conjuntamente, com Cavaco Silva e os seus seguidores (Eurico de Melo) criticavam essa adesão.

Foram, pois, eles – Nova Esperança - os construtores do papel de *Salvador da Pátria* que institucionalizou Cavaco Silva no governo, sendo, portanto, os apologistas cimeiros da *transformação* do Estado português numa marioneta do capital financeiro (privatizações bancárias e seguros, grandes empresas, predomínio bolsista especulador, reconstituição do latifúndio, destruição da produção piscícola).

3 – A derrota do processo revolucionário em 25 de Novembro de 1975 abriu as portas à implantação da chamada Democracia, ou seja a República que a grande burguesia desejava para implantar o seu modelo económico capitalista.

Ora, a questão da implantação de um novo sistema político que a Constituição de 1976 preconizava, com a apropriação dos meios de produção e distribuição, com o golpe de Estado novembrista, deixou de estar, desde aquela data, na ordem do dia.

Os partidos que o defendiam foram, paulatinamente, adaptando-se a essa realidade, e, tacitamente, aceitando-a.

A questão da revolução abrilista como processo socialista deixou de o ser, desse modo, com os anos de distanciamento, uma questão portuguesa, como o deixou de ser europeia.



O regime democrático tornou-se assim uma república do Capital e este estabeleceu-se, até agora, com todo o seu autoritarismo no espaço europeu, desprezando direitos nacionais, os interesses das classes trabalhadoras. O capital financeiro alastrou como uma sanguessuga sobre a União Europeia.

Ora, a capitulação dos antigos partidos ditos de esquerda ao *arco* do regime, à depreciação de um programa revolucionário socialista, tendo-se inserido numa *ala esquerda* dentro do regime de democracia, levou ao alheamento das classes trabalhadoras.

Com os partidos ditos radicais dentro da ordem estabelecida, - e o apoio envergonhado ao actual governo o demonstra - a consciência política dilui-se.

As classes trabalhadoras sentiram essa realidade, quando no rescaldo do 25 de Novembro viram os partidos que se reclamavam do poder socialista representados então no Parlamento – PS, PCP e UDP – aceitarem *o status quo*, com mais ou menos esbracejamento, estabelecido pelos organizadores do golpe de Estado novembrista.

As suas lutas, os seus protestos, as suas proclamações, pautaram-se sempre, desde então, nos limites da Constituição. Ou seja, dentro da ordem novembrista.

Toda a movimentação que se seguiu, inclusive, as lutas dos últimos quatro anos, que fizeram crescer um partido como o Bloco de Esquerda, como esperança, se balizou nesse estreito caminho dessa democracia. Da ordem.

Embrulharam-se numa falsa *política prática progressista* de respeitabilidade. Olharam essencialmente para a reforma, desprezaram a revolução.

4 –  Com a crise mundial em crescendo, o conflito de interesses sociais ir-se-á aprofundar e irá estilhaçar em múltiplas facções os partidos desse regime democrático.

O que irá resultar desse processo? A evolução será ditada pelas condições materiais e pelas circunstâncias políticas.

Para os interesses das classes trabalhadoras, o essencial é ter um programa de ruptura, de caminho de um novo regime.

Naturalmente, se houver um pendor político a seu favor, elas irão intervir. Actuarão conforme os acontecimentos. É certo.

Todavia, com um rumo definido, com programa político inserido num movimento crescente com consciência ideológica, o avanço da defesa dos seus interesses cimentar-se-á rapidamente e terá capacidades imediatas de vencer e subsistir. O tempo o vai dizer.






terça-feira, 8 de março de 2016

O *SOCIALISMO* DE SANDERS É PRENÚNCIO DO COLAPSO DO CAPITALISMO DE WALL STREET?


1 - As nuvens de uma crise económica, política e social de envergadura pairam sobre o actual sistema capitalista mundial, dos Estados Unidos à China, passando pela União Europeia (UE).

A ameaça da actual crise não está isolada da crise financeira-económica de 2007/08, provocada pelo capital financeiro a partir dos Estados Unidos da América, que procurou fazê-la  recair, essencialmente, sobre a UE.

No passado mês de Março, os sinais premonitórios vieram, novamente, do sistema financeiro ocidental.

No principio do mês, o alerta veio de dois grandes bancos, um do Reino Unido, o Royal Bank of Scotland (RBS), o outro dos Estados Unidos da América, JP Morgan.

Ambos admitem uma perspectiva sombria para a economia mundial, com um cenário "semelhante a 2008".

Os dois grandes bancos recomendaram aos investidores capitalistas que façam rapidamente a venda das suas acções.

O Royal Bank of Scotland (RBS), inclusive, encorajou os investidores a desfazer-se de tudo, excepto títulos de dívida (bonds) de alta qualidade.

Já o JP Morgan coloca de lado mesmo o mercado de acções e, pela primeira vez em sete anos, recomenda aos seus clientes vender acções «a qualquer sinal de turbulência».

O RBS, por seu turno, sustenta mesmo que se vai estar perante em «ano bastante devastador».

Alguns dias depois, a presidente do FED (o banco central norte-americano), Janet Yellen, afirmou-se preocupada com o cenário da economia mundial, em particular, a norte-americana, que está, praticamente, estagnada.

Ao depor perante o Congresso dos Estados Unidos, Yellen alertou que a queda nas bolsas mundiais deve tornar mais lento o processo de alta dos juros americanos. A declaração acentua as suspeitas de crise nos mercados globais.

Esses mercados mundiais, na perspectiva do capitalismo norte-americano, perderam cerca 12 biliões de dólares em valor comercial desde o início do ano. Os grandes bancos admitem mesmo o risco de uma recessão económica nos Estados Unidos. (A actual +viragem+ dos políticos republicanos candidatos presidenciais para um processo de fascização do regime norte-americano está em sintonia com esta realidade: o capital financeiro procura a salvação no poder político).


2 – A crise capitalista económica-financeira de 2007/08 teve particularidades que, na actualidade, atingem maiores proporções, pois o seu processo produtivo está em fase de ruptura com as relações de produção que indiciam uma inversão no incremento das forças produtivas que já não se enquadram nos limites de um sistema social capitalista.

Nestes quase 10 anos de crise contínua, que se agrava, ocorreram, no entanto, situações novas que se devem assinalar.

Mas, permanece uma *obsessão* que os Estados Unidos da América sobre o aprisionamento e controlo da União Europeia.

Em 2008, foi um ataque directo ao sistema financeiro, e, particularmente ao enfraquecimento do euro como moeda de troca mundial alternativa ao dólar.

Na actualidade, assiste-se a uma conjugação económico-social de procura, novamente, de enfraquecimento da unidade da UE: um fluxo migratório descontrolado fomentado (e em sintonia) pelo aliado ocidental dos EUA/NATO, a Turquia, a ameaça da saída da União do Reino Unido, aliado preferencial norte-americano (a razão principal é manutenção - sem interferência do Eurogrupo - da City londrina, parceira de peito da Wall Street), e ataques concertados do lado norte-americano à indústria automóvel e ao grande banco  Deustche Bank, ambos alemães, a pretexto de ilegalidades.


Tal como em 2007/2008, a razão principal está no euro como moeda alternativa ao dólar (euro este que resistiu e, apesar das incertitudes presentes parece resistir e restabelecer-se, ainda que lentamente) e no imenso mercado europeu – a UE continua a ser a principal potência comercial, que atrai novos países ao seu território -Bósnia-Herzegovina, Turquia, Macedónia, Montenegro e Sérvia).

/A UE só avançará na sua caminhada para um grande espaço político se restabelecer a cooperação harmónica interna e se separar, militarmente, dos EUA/.

3 – Reflictamos sobre as situações novas surgidas desde o início da crise de 2007/8.

Fortaleceram-se potências e grupos de potências face à hegemonia norte-americana: a China evoluiu no seu processo produtivo, adquiriu o estatuto de potência comercial e incrementou grandemente o seu arsenal castrense; a Rússia, apesar da crise petrolífera, transformou-se em potência militar capaz de influenciar, no Mundo, a geo-estratégia em confronto, sem peias, com os Estados Unidos; através da parceria estratégica económica e financeira russo-chinesa, impulsionou-se a formação dos chamados BRICS (Building Better Global Economic´s), que junta ainda a Índia, Brasil e África do Sul, economias que procuram forjar uma moeda de troca fora da influência do dólar.

Na actual fase da crise do sistema capitalista, o que é novo e mostra o seu aprofundamento, ele está a atingir não só as economias ditas +ocidentais+, mas igualmente as emergentes dos BRICS.

E todos essas potências estão dominadas por um militarismo concorrencial exacerbado, que as leva a desviar dinheiro, crescentemente, para os seus complexos industriais castrenses, contribuindo, deste modo, para a bancarrota geral.

4 – É nos Estados Unidos da América, ameaçados pela possível recessão imediata, pela estagnação continuada do seu processo produtivo industrial, pelo desemprego profundo e pela falência de grandes cidades da indústria, como Detroit, que surge, pela primeira vez, na sua História, um programa de um candidato presidencial do regime, de uma ala do Partido Democrático, que admite a possibilidade de haver uma *revolução política* e instituir no país um modelo +socialista+ (claro que numa versão social-democrata) de governação.


O colapso económico-financeiro norte-americano também surge, por outro, indiciário na candidatura presidencial republicana, especialmente, em torno de Donald Trump e Ted Cruz, que preconizam uma fascização do sistema político em defesa declarada de Wall Street.

É, precisamente, na questão de alternativa face ao agudizar da crise económica e social que se coloca a questão que se poderá colocar: que novo sistema político irá surgir?

Existe no Mundo, mas de maneira evidente na Europa, berço das grandes revoluções socialistas, uma corrente política e social que preconiza uma *mudança* face aos regimes representantes do capital financeiro.

Mas, esta corrente, que se agrupa em partidos, tipo Bloco de Esquerda, PCP (Portugal), Podemos (Espanha), Syriza (Grécia), Partido de Esquerda (França), a Esquerda (Alemanha), Sinn Féin (Reino Unido e Irlanda) e Partido da Esquerda (Suécia) circunscrevem os seus programas políticos na arena da Democracia, ou seja são uma *ala esquerda* dos regimes instítuidos.

Se houver um colapso do actual sistema capitalista, e, irromperem processos revolucionários – e eles irão aparecer de uma maneira ou de outra – o seu sucesso será inserto, se não forem apresentados, com clareza, programas revolucionários, que rompam com o marasmo político actual.