sábado, 28 de novembro de 2015

QUEM SÃO OS CRIADORES DO ESTADO ISLÂMICO?

1 – Um avião comercial russo despenhou-se, há cerca de um mês, no Sinai, Egipto, morrendo 224 pessoas, devido a um atentado, que foi reivindicado por um grupo denominado Al-Qaeda, que é o ramo local da Irmandande Muçulmana egípcia.

Na terça-feira passada, um avião militar russo foi abatido junto à fronteira turco-síria por um caça F-16 da Turquia, sob a alegação de que voou em território turco. A Turquia é governada por um partido islamista radical, identificado, tal como a Irmandade Muçulmana, com o wahbadismo proveniente da Arábia Saudita.

Mas, antes, dia 12, já houvera atentados sangrentos (43 mortos) na capital libanesa Tripoli, numa área de controlo do Hezbollá, a que se seguiram um hotel no Sinai (Egipto) e um atentado em Tunis, Tunísia, com 12 mortos, polícias da guarda presidencial. Sempre em nome do EI ou da sua cara-metade Al Qaeda.

Em plena campanha eleitoral turca, que veio a dar a maioria governamental, ao líder islamista Recip Erdogan, foi realizado um brutal atentado em Istambul, (cerca de 100 mortos), mas, estranhamente, contra os apoiantes do partido secular HDP que integra, essencialmente, a população étnica curda do país. 

Também aqui houve uma reivindicação do EI, mas quem a oficializou foi o próprio Erdogan, depois de ter procurado acusar um partido pró-curdo, ilegalizado, o PKK. 

Nihil obstat, diria o Papa católico...

A 13 de Novembro, ocorreram vários atentados em Paris, que provocaram 130 mortos e centenas de feridos, reivindicado pelo EI, sendo que os seus executantes, na sua maioria, foram cidadãos franceses e belgas, segundo fontes oficiais, acrescentando um vago: foram planeados longe.

De repente, o Chefe de Estado francês, François Hollande, considerou que o seu país estava *em guerra*, situação esta que se estendeu, em pouco tempo, à Bélgica e à Alemanha, com repercussões imediatas nos restantes países da União Europeia, que não os mais recentes de Leste, o que temos de classificar como *curiosidade*.

Não sabiam os EUA e a UE que o fluxo de homens para as fileiras e treino, bem como toda a logística, em bens e armamento, do EI, no interior da Síria somente se podia (e pode processar) através das fronteiras com a Turquia, Jordânia e Israel?

E que todo esse movimento era, tacitamente, autorizado por aquelas potências, incluindo o seu regresso aos países da UE? 

Não é do conhecimento público que os campos de treino e de retaguarda dos chamados «rebeldes» opositores do regime da Síria se situam, justamente, na Turquia, Jordânia e Israel?

E, finalmente, a Turquia atrever-se-ia a abater o avião militar russo, se não tivesse as costas quentes ou até o assentimento da parte dos Estados Unidos?

A Síria está rodeada de fronteiras de países que favorecem o EI

2 – A política de violência desenfreada do chamado Estado Islâmico não nasce, por acaso, fora do chamado *mundo ocidental*,  nem foi planeada +algures+ no Médio-Oriente, por obra e graça do espírito santo.



Senator John McCain with ISIS Chief Abu Bakr Al-Baghdadi (circled left) and terrorist Muahmmad Noor (circled right).
O senador John McCain, responsável pela Comissão dos Serviços Secretos do Senado, com líderes jihadistas. À direita, al Bahagadi, à esquerda, Mohammad Noor, ambos assinalados.

Recuemos um pouco.

A desagregação da antiga União Soviética, após a renúncia de Mikhail Gorbatchov à Presidência da URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) e de secretário-geral do PCUS (Partido Comunista da União Soviética) leva a um frenesim de ascenso imperialista no Mundo por parte dos Estados Unidos da América, e a cumplicidade abjecta das oligarquias políticas e económicas, ainda hoje dominantes, na União Europeia.

Esse frenesim, num julgamento apressado de que o domínio total do Mundo seria a realidade do sistema financeiro de Wall Street, levou Washington a apostar no apoio à fragmentação, explosiva e sanguenta, da Jugoslávia, por nacionalidades e grupos étnicos, um processo iniciado, de maneira difusa, em 1990.

Impulsionou então, de maneira aberta e sem qualquer rebuço ou preocupação de consultar os povos locais sobre os seus interesses nacionais, em fazer avançar a máquina militar da NATO (directa ou indirectamente), não só sobre os países do leste europeu, que se sacudiram do Pacto de Varsónia e da suserania da ex-URSS, mas igualmente como sucedeu em 1990, no Iraque, em 2001 no Afeganistão e 2003, novamente, no Iraque, e, posteriormente, na Síria, depois de se imiscuir em todo o Magreb, a pretexto das chamadas *primaveras árabes*.

Tudo isto, com a conivência total e a incapacidade dos dirigentes mais abjectos e senis, não só da UE, mas também do próprio Médio-Oriente e do Extremo-Oriente.

Incluindo, numa primeira fase, as classes dirigentes da Federação Russa e China, que, em nome do *realismo* sucumbiram às suas dificuldades económicas, políticas e militares.

Ora, toda esta situação não podia continuar, nem, mesmo, ter uma duração mais dilatada.

Em primeiro lugar, devido à deterioração crescente interna da economia norte-americana, cuja visibilidade surgiu na crise bolsista de 2001, e que provocou uma recessão enorme e o aumento exponencial do desemprego. 

A crise financeira de 2007 agravou o afundamento económico.

Aliado a estes revezes, somaram-se os custos astronómicos do militarismo desenfreado, com derrotas sucessivas no Iraque e Afeganistão, e, o impasse evidente na Síria.

O retrocesso do seu dispositivo operacional castrense reflectiu-se nas suas fraquezas geo-políticas actuais.

Em segundo lugar, o ressurgimento de *frentes* concorrenciais na hegemonia de grande potência económica e militar.

A que mais preocupou a oligarquia norte-americana, na entrada do século XX, foi a pujança comercial da UE, erigida, então, a principal potência comercial do mundo, e, acima de tudo, a capacidade que a moeda europeia começou a adquirir nas trocas internacionais, pondo em causa a hegemonia do dólar.

Daí, os ataques sistemáticos à unidade europeia -elo fraco -, forçados, abertamente, desde a crise de 2007.

Em terceiro, o renascimento, por um lado, da potência militar russa interventora, depois da crise política e económica subsequente à destruição da ex-URSS, por outro, o incremento da China, como potência económica mundial e a sua militarização acelerada em crescendo.

Este avanço de potências capitalistas concorrentes, em ascensão, em confronto directo com a potência, económica, política e militar, ainda em supremacia, mas ferida por uma decadência que se acentua, exige que se construam, cada vez mais, grandes espaços territoriais assentes em poderes estatais consolidados e livres de entraves conflituosos, que prejudicam um maior enquadramento negocial comercial internacional.

Ora, a intervenção imperial actual norte-americana, decadente e desesperada, cria desmembramentos de Estados, procura recriar novas estruturas neo-coloniais, de carácter quase feudal e de retrocesso civilizacional.

Em quarto lugar, o menosprezo pelos interesses dos povos e a sua exploração sem freio em que a auto-elogiada intervenção em nome da «segurança nacional» e o seu desígnio messiânico de imposição dos «direitos humanos» e a democracia sob a égide norte-americana, conduziu à formação de grupos e partidos, particularmente no Médio-Oriente, de inspiração nacional e libertadora.

Todos eles inspirados e organizados, sob a cobertura da ideologia religiosa, no caso em apreço, pelo sunismo wahbadista que enquadra um visão imperial de submissão política religiosa.

Aproveitando esta orientação, os Estados religiosos do Golfo de ideologia wahabadista, como Árabia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Qatar, Barein, Omã, principalmente o primeiro, financiaram e impulsionaram as formações fundamentalistas da al Qaeda, Frente al Nusra e Estado Islâmico, com o controlo político e militar dos Estados Unidos.

Estes, desde a invasão do Afeganistão pela antiga US, formataram, organizaram e financiaram, em estreita ligação com a monarquia saudita, a primeira formação político-militar sunita wahbadista, a Al Qaeda, para ser a *tropa de choque* da sua estratégia geopolítica no Médio-Oriente, e, posteriormente, em África e no Magreb.

Na África do norte, o wahadismo procurou impor-se, primeiro na Argélia, sem o conseguir, apesar de uma guerra civil mortífera e prolongada, e, posteriormente, com as chamadas *primaveras árabes*, através da implantação da al-Qaeda no Magreb Islâmico (AQIM), que hoje, sem preocupações, dizem «obedecer» ao Estado Islâmico.

Na África, a sul do Magreb, o wahbadismo espalhou-se pela *missionação* de organizações não governamentais sauditas, como a Liga Mundial, a Assembléia Mundial da Juventude Islâmica e a Federação de Mab, de onde foi emanados grupos, como o Boko Haram.

Os chefes das principais organizações, como o EI e a AQIM, são elementos que passaram pelas
mãos da CIA, serviços secretos norte-americanos. 

Abu Bakr al-Bagdadi, que se auto-intitula califa do EI, é um iraquiano, que esteve quatro anos num campo de internamento norte-americano e que foi *solto* após uma *reeducação* à mão dos agentes americanos. Em poucos meses, juntou a chamada al Qaeda do Iraque com a Frente al Nusra (que era chamada estrutura oposicionista «moderada» síria, apoiada pelos EUA e França), dando origem ao EI.

O responsável da AQIM e actual «governador» da região de Tripoli, da dividida Líbia, Abdelhakim Belhaj, foi detido na Malásia, em 2003, no que foi publicamente divulgado como uma "rendição" extraordinária.

Esteve, aparentemente, durante uns anos, numa prisão secreta em Banguecoque, e, foi considerado «recuperado». Apareceu, em 2011, na invasão da Líbia pelas tropas ocidentais, à frente de um grupo da al Qaeda.

3 – A parceria entre os interesses islâmicos whabadistas retrógrados, nacionalistas e imperialistas, e os norte-americanos e os seus cúmplices ocidentais, está a entrar em
em conflito à medida que os primeiros se sentem com capacidade para avançarem pela sua própria via.

Essa é a fase actual, ainda que embrionária, mas que já mostra um processo que pode ter pernas para andar, se não for combatido de forma revolucionária e progressista.

Os atentados de Paris mostram, por um lado, que existe, no interior da sociedade europeia, um descontentamento larvar entre uma comunidade de migrantes e seus descendentes, provindos de países islâmicos, que estão espezinhados no seu bem-estar e injusticiados.

Por outro, que esse grupo social, no seu combate por um melhor nível de vida, procura a organização em torno de interesses reaccionários e retrógrados da religião que dizem professar.

Espaço este não não é ocupado por formações políticas de vanguarda nos Estados europeus.

Para lutar contra o islamismo wahabadita, quer no Médio-Oriente, quer nas suas *bolsas* europeias, a via a seguir terá de se centrar, quer no desenvolvimento económico e comercial dos territórios árabes, quer na sua organização política estatal nacional estável, dando satisfação, não a processos militaristas, mas a reivindicações de liberdade, de separação entre a religião e os Estados, de destruição das estruturas monárquicas semi-feudais.

O mesmo se coloca para o islamismo xiita.

campo de treino do EI na Turquia

4 – Mas, agora, a finalizar, uma questão secundária, mas importante:

Porque será que os militantes fundamentalistas islâmicos se organizaram, com relativa facilidade, no interior dos países da União Europeia?

Ou existiu um menosprezo enorme pela segurança colectiva, ou uma cumplicidade descarada com as estruturas *jihadistas*.

Naturalmente, os dois aspectos co-existem.

Mas, o segundo aspecto é o mais grave: os jihadistas «adormecidos» fazem parte da rede de parceiros que os serviços secretos utilizam, por vezes, nas *operações sujas* contra os interesses concorrentes das potências internacionais e regionais, como a Rússia, a China ou o Irão.

Os serviços de segurança europeus podiam não ter um conhecimento total das organizações islamistas no espaço da UE, mas, certamente, estavam a par da sua movimentação constante e sem controlo entre a Turquia, a Arábia Saudita, Qatar, a Jordânia, Israel, as zonas controladas pelo al Qaeda na Líbia, Síria ou Iraque.

Não podem agora limpar as mãos como tivessem sido violados como virgens inocentes.

Não, eles são cúmplices conscientes, como os seus próprios governos.

E tem de se lhe pedir responsabilidades.


segunda-feira, 23 de novembro de 2015

VATICANO: A JUSTIÇA TERRENA PARA TAPAR AS MISÉRIAS DO PAPADO

1 – O Vaticano, sede da religião católica apostólica romana, que entra em metamorfose, quando lhe interessa, em Estado, que denomina Santa Sé, para tratar dos assuntos *banais* terrenos, e que tem no topo um argentino que serviu, em nome de Deus, a ditadura sangrenta dos generais fascistas, de nome Jorge Mario Bergoglio, decidiu julgar, em Tribunal mundano, os homens que colocaram a nú a hipocrisia religiosa de praticar o bem público.

Mas, qual é o porquê deste interesse repentino do Vaticano etéreo, pela justiça e pelo castigo terrenos, ele, como eminência de Deus, anuncia, ao longo dos séculos, que a salvação está *nos céus* e *na graça divina*?
A razão para este apego está na edição recente de dois livros, da autoria de dois jornalistas italianos de documentos do Papado sobre a ganância, nepotismo e corrupção no interior da Cúria vaticana.



Os livros são: «Via Crúcis», do jornalista italiano Gianluigi Nuzzi, e «Avareza», do também jornalista Emiliano Fittipaldi.

Além destes dois jornalistas italianos, a inquisição papal engloba ainda três funcionários da Santa Sé: o sacerdote espanhol, do OPUS DEI, Lúcio Vallejo Balda, que exerceu as funções de secretário da Comissão investigadora dos organismos económicos e administrativos da Santa Sé (Cosea), um ex-colaborador desta Comissão Nicola Maio e a ex- relações públicas que integrava a mesmo instituição Francesca Chaouqui.

O inquisidor do Vaticano considerou que os cinco cometeram os «crimes» entre Março de 2013 e 5 de Novembro de 2015, um dia antes da publicação dos livros.

Segundo a inquirição, os três funcionários do Vaticano formaram "uma associação criminosa organizada" com o objetivo de "divulgar informações e documentos relativos aos interesses fundamentais da Santa Sé e do Estado".

A Santa Sé – religiosamente – diz-se envergonhada e indignada com os livros que, segundo a instituição, onde foram usadas informações que nunca deveriam «ultrapassar» os muros do Vaticano.

O «roubo» desses documentos e a sua divulgação – na justiça terrena do Vaticano  - é um delito já estabelecido pelo Papa Francisco, esse democrata dos quatro costados, em Julho de 2013 e admitindo uma pena de prisão de 4 a 8 anos.

Os livros o que divulgam, realmente, de *segredos* de Estado?

Simplesmente isto:  desvio de dinheiros, negócios mafiosos, bem como extravagância e o clientelismo da Cúria, prevalecentes desde quando Francisco foi eleito em Março de 2013, fenómenos estes que contribuíram, aliás, para a renúncia de seu predecessor, Bento XVI.


2 – Alguns desse segredos desvendados.

A Santa Sé possui mais de 5 mil imóveis, em Roma e em Paris, sem que haja um registo detalhado.

Estão avaliados em 2,7 mil milhões de dólares, mas este valor, segundo o jornalista Nuzzi, será sete vezes maior que o declarado nas contas da Santa Sé.

O que preocupa *a segurança de Estado* da Santa Sé? 
Muitos estão arrendados a cardeais e a personalidades, ligadas à Igreja Católica, que pagam menos de 10 anuais euros por apartamentos de 300 m2.

Os documentos revelam que cada processo de beatificação e canonização dos seus idolatrados *santos* é um negócio que pode ascender a 500 mil euros.

Outros documentos referem – Nuzzi revela –que, por cada dízimo de 10 euros, arrecadado nas paróquias católicas em todo  e que são enviados para o Vaticano apenas quatro se destinam *a caridade*, os restantes seis euros vão para o mundo. Segundo Nuzzi, de cada 10 euros que são enviados para o Vaticano apenas quatro se destinam a serviços de *caridade*, os restantes são destinados despesas privadas da Cúria.

O sistema de pensões da Santa Sé tem um «um buraco negro», ou seja um défice superior a 700 milhões de euros em 2014.

Denuncia-se a traficância existente no sistema de farmácias, com medicamentos, tabacos e postos de gasolina existentes no interior dos muros da Santa Sé, produtos esses que estão isentos de impostos.

Para aceder a esses produtos, é necessário um cartão especial.

O que está a suceder? Na actualidade, há 41 mil portadores desse cartão.

Ora, o Estado da Santa Sé tem somente 800 habitantes, 2.800 funcionários leigos e mil reformados.

Outros documentos confirmam o que já se sabia antes desvios e lavagens de dinheiro, derrapagens de contas, movimentação sem controlo de transacções monetárias.

Os autores dos livros informam que o que relatam estão estribados em  documentos, gravações, relatórios, gravações (incluindo do próprio Papa), e-mails, actas de reuniões e fotos que provieram de vários departamentos do Vaticano, bem como informes dos revisores e auditores de contas – incluindo os da consultora Ernst & Young -, que – afirmaram - lhes foram entregues pessoalmente.

3 – Com este julgamento o que pretende a Igreja Católica?

Em primeiro lugar, procura conter e esconder, pela via repressiva interna, as denúncias públicas constantes que surgiram nos últimos anos sobre as práticas de ostentação e nepotismo que percorre toda a Cúria papal.

Em segundo, tentar alargar um projecto de governo extraterritorial, que está subjacente à sua verdadeira função como empresa capitalista mundial, que controla uma fatia elevada das riquezas dos países onde se implantou, nomeadamente, em Itália, França, Reino Unido, Alemanha, Espanha, Portugal, Polónia, Estados Unidos da América, a maioria da América Latina e em vários países do Extremo-Oriente.

No caso em apreço, a Itália, julgando dois jornalistas nacionais, sob o pretexto de «delito contra a pátria». Ou seja, intitula-se como *pátria*, com poder de Estado para actuar sobre outros países.

Em terceiro lugar e ligado ao ponto anterior, utilizar a repressão e a justiça, como método orientador universal, para destruir a liberdade de informação e *ensaiar* um processo político de fascização internacional, em nome da *segurança interna*.

Naturalmente, a Santa Sé sente que a sua imagem hipócrita, em torno de uma pretensa actividade *pastoral* no Mundo para  combater a pobreza, através da caridade, está a ser posta em causa pela crescente divulgação da sua verdadeira acção como grande empresa comercial capitalista.

A sua imagem *missionária* pelos cantos mundos não é mais do que uma cobertura real para penetrar nos tecidos económicos dos diferentes países para estabelecer uma teia poderosa de uma enorme empresa mafiosa especulativa capitalista.

Claro que a sua *função religiosa, com a boca na pobreza* ainda engana milhões de pessoas pelo planeta, mas essa *face dourada* vai-se desvanecendo progressivamente.

Só os fiéis fundamentalistas – e os oportunistas que deles vivem – é que são capazes de dar a vida por essa imagem distorcida.

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

MÉDIO-ORIENTE: WASHINGTON COMEÇA A NÃO MORAR ALI

1 - O Chefe de Estado da Federação Russa, Vladimir Putin, em plena reunião cimeira do G-2, que ocorreu, domingo e segunda-feira, na Turquia, denunciou que 40 países, incluindo alguns dos participantes naquele conclave capitalista, financiavam o auto-proclamado Estado Islâmico (EI).

Os eventuais visados calaram, nem sequer protestaram perante a denúncia generalista, o que significa que consentiram.

Aqui começa o jogo da hipocrisia e dos bastidores da reunião magna capitalista.
Todavia, ficaremos presos a banalidades e denúncias gerais, se não se analisar, com racionalidade, o que realmente se desenrola no terreno e verificar quais são os objectivos estratégicos que se pretende atingir com esse EI.

2 – O EI,  a Al-Qaeda, bem como a AQI, a Frente al Nusra, que agora se verifica que estão em sintonia com os dois primeiros, nasceram do ar?

Ronald Reagan reunido com líderes talibans


Provindo de estrangeiros, criados fora da Síria, como se conseguiram estabelecer e conquistar terreno naquele país árabe?

A ideologia religiosa retrógrada do islamismo sunita, que, primeiramente, se *instituiu* em torno da Al-Qaeda, não é propriamente novidade na região do Próximo e Médio-Oriente.

Na segunda década do século XX, no rescaldo da desintegração do Império Otomano, surgiu no Egipto uma organização chamada Irmandade Muçulmana, cuja orientação político-religiosa se baseou no wahbadismo sunita (governação segundo a Sharia, Jihad na expansão externa), prevalecente na Arábia Saudita, que veio, desde então, a apoiar, financeiramente, a entidade egípcia.

Todavia, apesar de diversas tentativas no Egipto, por vezes, de tipo golpe de Estado – assassinato do Presidente Anwar Sadat -, não tiveram expressão prática.

Nos princípios dos anos 80, começou a ser forjado, com a cumplicidade de Israel, o *Movimento de Resistência Islâmica* (Hamas), como braço palestiniano da Irmandade Muçulmana, para contrabalançar e até fazer esboroar o papel, então, crescente da Organização de Libertação da Palestina (OLP) na luta nacionalista naquele território, ocupado pelo regime israelita.

Todavia, a «criatura» que teve a mão de Telavive, quando se implantou, roeu-lhe a corda e remeteu-se ,como força nacionalista, contra o usurpador judeu.

Esse Hamas inicial, que era apadrinhado pelos EUA e pela rede ocidental subserviente da Inglaterra, França e Alemanha, levou aqueles, no imediato, a considerar, depois, o mesmo se transformara numa *organização terrorista*, curiosamente o que não foi seguido pela Noruega, Brasil, Rússia e África do Sul, entre outros.

A invasão soviética do Afeganistão, em 1979, vai ser o cadinho para utilizar a ideologia wahbadista fundamentalista e os seus seguidores ao serviço da estratégia geopolítica imperial dos Estados Unidos.

Naturalmente, quando se cria algo que comporta, no seu interior, uma outra visão e projecto de conquista mundial, esse algo só serve se for, rigorosamente, controlado.
Caso do panislamismo e da guerra santa, pois ele pode fugir – ou tentar fugir – aos ditames do fomentador, protector e financiador, e tornar-se um entrave, um *monstro*, fora das barras políticas e militares que os EUA desejavam.

Ora, o fundamentalismo wahbadista que germinava na clandestinidade, saltou à luz do dia quando a potência norte-americana enquadrou – ela própria – o financiamento, o treino e a divulgação da ideologia de uma então obscura organização, formada na Arábia Saudita, chamada Al Qaeda, rotulando e dignificando os seus *milicianos* como mujahidines combatentes da liberdade.

A organização Al Qaeda, liderada por um senhor, ligado à família real saudita, chamado Ussama bin Laden, recebeu treino militar, sob a direcção da CIA e o Pentágono (EUA) e o MI6 inglês.

ISI e cia diretores em dormir camp1987 mujahideen com o Diabo: Como EUA e Arábia apoio da Al Qaeda levou a 9/11
na primeira fila, da esquerda para a direita: general Hamid Gul, director do serviços secretos do paquistão, William Webster, director da CIA, Clair George, vice-director da CIA para as operações, um coronel dos Serviços Secretos paquistaneses e Mitt Bearden, responsável operacional da CIA, num acampamento dos muhadijines junto à fronteira do Paquistão em 1987.


Esta parceria trouxe duas componentes essenciais para a implantação da Al Qaeda: financiamentos avultados e armas sofisticadas, incluindo mísseis terra-ar e um território, onde se pudesse radicar, estender e criar os seus meios de subsistência, neste caso, o Afeganistão, com a produção e distribuição de drogas.

Sabe-se já há uns anos, depois de haver acesso a audições no Congresso norte-americano que a Administração Ronald Reagan entregou a esse mujahidines cerca de dois mil milhões de dólares.

Um valor quase idêntico foi fornecido pela Arábia Saudita. Além das somas elevadas – e não contabilizadas – das monarquias dos petrodólares do Golfo.

Com uma retaguarda bem coberta: o Paquistão e os seus serviços secretos que esconderam, abertamente, bin Laden, como hóspede de Estado, enquanto lhes foi útil.

(A cobertura ocidental a Bin Laden está bem patente no facto de, em 1993, a Al Qaeda ter aberto um escritório de representação em Londres, sob um disfarce, chamado «Advice and Reformation Commitee», que, segundo a imprensa de então, teria capacidade de intervir em diferentes territórios da Europa e América).

O que está, portanto, subjacente a essa parceria entre os EUA, os seus cúmplices e o wahbadismo sunita, ou seja, neste caso, Arábia Saudita e os Estados do Golfo, é apenas isto: o controlo das fontes de matérias-primas – comum às multinacionais petrolíferas e aos magnates monárquicos daqueles estados. Não é, por acaso, que os *terroristas* os poupam!!.





Mas, também, uma frente geopolítica no exterior, que, em certa medida, é do interesse comum, embora com objectivos diferentes.

Para os EUA, a dispersão europeia, no caso da Europa; para o wahbadismo, a sua penetração na Europa e norte de África e Próximo e Médio Orientes, bem como Bósnia e Kosovo.

E ainda uma reformulação total da relação de forças no Magreb e no Oriente Médio.

É, pois, esta parceria que vai fazer *medrar* a ideologia imperial do wahbadismo (centrado na tradição árabe do século VIII).

3 – Já nos referimos ao Afeganistão – e igualmente a situação se duplicou para o Iraque –, vejamos, agora, o que sucedeu na desagregação da ex-Jugoslávia e, em particular o que servir de pontos de apoio para +o fundamentalismo islâmico+.

Em 1992, irrompeu a guerra na Bósnia.

De imediato, os EUA, através do Pentágono e a CIA, disponibilizou aviões para que milhares da *combatentes* filiados na Al Qaeda, integrassem as forças pró-ocidentais naquele território, acompanhado por tropas especiais norte-americanos, com armas e bagagens, em clara ultrapassagem dos embargos das Nações Unidas.

Um novo flanco de ataque norte-americano virado para a Europa surgiu, posteriormente, no Kosovo, e, também aqui sob o véu da religião. Nos inícios dos anos 90, começaram a multiplicar-se naquele território autónomo da ex-Jugoslávia conflitos forjados entre kosovares e sérvios em torno da dicotomia religião cristã ortodoxo e islâmica.

Verificou-se que, em pouco tempo, apareceu um Exército de Libertação do Kosovo (UÇK), liderado elementos recrutados como *muahjadines*, cujo centro era um grupo liderado por Mohamed al-Zauahiri, irmão do então número dois da Al Qaeda, Ayman al-Zauahiri.

A imprensa da época noticiou que aquele UÇK estava a ser municiado em armamento por *agentes especiais* dos EUA e do Reino Unido.
Esta acção *encoberta* foi, mais tarde, +oficializada+ pela intervenção da NATO.
Kosovo tornou-se um ninho de islamistas radicais e de redes organizadas de tráfico de droga, com ligação ao Afeganistão e Turquia, sob a supervisão da CIA norte-americana.

Hoje, naquele território existe uma base permanente da NATO.

Campo Bondsteel, Kosovo

A partir de 18 de Dezembro de 2010, surgiram, mais ou menos, espontaneamente, em vários países do Magrebe e do Próximo e Médio-Oriente, movimentações populares contra os regimes corruptos e repressivos, que foram intitulados de «Primavera Árabe».

No meio dessas convulsões sociais, inicialmente, de carácter democrático, laico, misturaram-se entidades religiosos islâmicas wahabadistas, perfeitamente organizadas e com dinheiro para distribuir, que vieram a dominar e a jugular toda e qualquer perspectiva de impor simples poderes parlamentares burgueses.

Mas, façamos um pequeno interregno para remeter o prelúdio desta chamada *Primavera*.

O descontentamento e a repressão violenta nos regimes políticos do Magreb e do Médio-Oriente foi o traço comum com a consolidação daqueles após a época colonial.

Muitos desses regimes conseguiram cimentar-se, nessa fase, porque produziram algum bem-estar em sociedades que entraram em evolução política, rompendo com o medievalismo existente e afastando a religião da actividade política. Foi, na realidade, um processo revolucionário.

Diziam-se mesmo governados em nome de um *socialismo nacionalista*, que hostilizavam o imperialismo norte-americano.

A derrota desta via (com ditaduras pró-fascistas, corrupção generalizada) trouxe um marasmo e amorfismo, situação, a partir dos anos 80, veio a ser *ocupado* por um movimento reivindicativo assente no islamismo, conservador, quase medieval, na sua prática diária (vestuário, aplicação da sharia, leituras confinadas aos escritos e prédicas de Maomé, sob a supervisão de escolas islâmicas) islamismo que, ao mesmo tempo, organizou e dirigiu estruturas de apoio e enquadramento sociais, incluindo empresas que davam emprego.

Foi financiado e fomentado por dinheiro e quadros provindos da Arábia Saudita e Estados do Golfo, em estrita ligação com os EUA, Grá-Bretanha, França e Alemanha).

O primeiro grande conflito armado entre um poder +nacionalista socialista+ e o islamismo wahbadista sucedeu na Argélia, apartir de 1991, quando o poder de Estado, gerido pela Frente de Libertação Nacional (FLN), não concordou que a Frente Islâmica de Salvação (FIS), ganhadora das eleições parlamentares, ascendesse à governação.

Mas foi o Exército que tomou o poder e afastou o Presidente da República Chadli Benvedid, colocando no cargo Chadli Benvedid, um histórico da FLN.

Foram presos dirigentes e militantes da FIS (centenas, talvez milhares), aquela reagiu pela via armada.

Um confronto generalizado no país que trouxe mais de 200 mil mortos e se prolongou, em intensidade, até 2002, com a derrota da Frente Islâmica Armada (FIA) já como actual Presidente, Abdelaziz Buteflika, que foi ministro dos Negócios Estrangeiros de Ben Bella e Huari Boumediene.

Ao longo desta guerra civil, as autoridades estabelecidas acusaram, várias vezes, *a intervenção estrangeira*, nomeadamente, os chamados *afegãos*, ou seja combatentes provenientes do Afeganistão, que diziam controlados por Estados ocidentais e árabes.
De certo modo e em certo sentido, foi a própria fraqueza, aliada a um violência inaudita sobre as próprias populações que não aderiam as suas posições, que conduziu a essa derrota.

E isto porque o descontentamento social permanece, bem como um crescente repúdio da intromissão das potência imperialistas norte-americanas e europeias no assuntos internos dos países do Magreb e do Próximo e Médios-Orientes.

Estas evidências é que vão ser o motivo imediato e principal da chamada *Primavera Árabe*.

Na realidade, tal como atrás referimos, as movimentações começaram, pois, abertamente contra os corruptos e repressores governos desses países, como contra a subserviência dos mesmos para com a ingerência imperial, principalmente ocidental.

Os Estados Unidos, como apologistas verbalistas da democracia e *da igualdade de oportunidades*, não foram a lanterna dessas tentativas de revoluções. Pelo contrário, mereceram o repúdio generalizado.

Os participantes *laicos* dessas movimentações e tentativas de revoluções eram a face visível de uma alianças entre as classes assalariadas e uma parte das burguesias mais progressistas que desejam, com Estados unificados e libertos do semi-feudalismo, uma maior participação na integração dos negócios da globalização.

Mas, quer os assalariados, quer aquelas burguesias, estão reféns do seu pouco desenvolvimento e da falta de incremento da sua consciência política.

Na realidade, no retrocesso dessas movimentações para as mãos do islamismo wahabadista está na baixa consciência dos trabalhadores, não enquadrados em grandes centros produtivos, mas também da aliança entre a grande burguesia financeira especulativa e a burguesia comercial ligada aos chefes e dignitários religiosos.

Mas, o mais importante é o efeito prático dessas movimentações agora já sob a influência do islamismo: apenas se dão mudanças de regime em Estados republicanos laicos: Tunísia, Egipto e Líbia, e, travado na Síria até agora, apesar da intervenção ilegal e extraterritorial dos EUA, Inglaterra e França.

Na Tunísia, numa primeira fase o poder esteve directamente sob a influência dos salafistas wahabadistas. No entanto, precisamente, a Constituição estabelecida, após a subida dos salafistas, afirma-se laica, mas, mesmo assim, impõe que a religião do Presidente será *o Islão*.

No Egipto, a substituição do regime pró-fascista de Mubarak, ocupada, eleitoralmente, pela Irmandande Muçulmana, foi afastada, depois, em golpe de Estado pelos militares, quando os islâmitas pretendiam estabelecer uma governação assente na sharia.

Na Líbia, a desagregação do poder de Muhamar Kadhafi, republicano e laico, foi feito pela intervenção armada conjunta dos EUA, França e Inglaterra, com a entrega de territórios a diferentes grupos ligados à Al Qaeda e ao EI.

Na região de Tripoli, colocaram como governador Abdelhakim Belhadj, o chefe do Estado Islâmico, que formou campos de treino de mercenários na Líbia e tem uma delegação na Tunísia.

Nos restantes países, onde houve protestos significativos, os regimes permaneceram imutáveis, caso da Jordânia, Kuwait, Arábia Saudita, Bahrein, Djibuti e Iémen.

Este país, no entanto, este ano, está a ser sacudido por uma rebelião, que afastou o Presidente do poder, e se exilou...na Arábia Saudita.

4 – O que sucedeu, realmente, na travagem da chamada * Primavera* na Síria?

As grandes burguesias, que governam as grandes potências em reorganização como a russa, ou em ascensão como a China, ou inclusive as que se formam regionalmente, como o Irão, constataram que os EUA – e por arrasto, por impotência, a UE -, estavam a ir demasiado longe na sua pretensão de hegemonia mundial.

E essa hegemonia materializava-se no domínio absoluto das matérias primas petróleo e gás e no controlo praticamente absoluto do comércio  planetário.

Verificaram que a hegemonia expansionista norte-americana se estava a tornar mais agressiva, porque a sua economia estava em derrapagem e a sua moeda enfraquecia face ao aparecimento do euro e à entrada em força do yuan chinês.

A Síria é, para Wall Street, um centro de uma estratégia, justamente, para o domínio dos principais locais produtivos gaso-petrolíferos.

A Rússia avançou, deste modo, sustentado na sua capacidade militar e nuclear, contando com o apoio de uma política comum, por um lado, com a China, por outro com o Irão, não só numa aliança castrense, mais ou menos sólido, mas essencialmente numa aliança económica euro-asiática que enquadra todos os Estados situados entre o espaço russo-chinês.

Esta tomada de dianteira, que, igualmente, pressupôs eficácia no combate aos fundamentalismo wahabadista, instalado na Síria, mas também no Iraque, trouxe, em pouco tempo, uma inversão de forças e mesmo de alianças mundiais.

Entrou-se numa nova era geo-estratégica e geo-política.


E os ventos já não sopram de Washington. 

domingo, 15 de novembro de 2015

QUEM ESTÁ A PROCURAR DESFAZER A UNIÃO EUROPEIA?

1 –  As coincidências não são acidentais.

Se nos concentrarmos no que está a suceder na União Europeia, desde que aquela adquiriu um estatuto de grande potência comercial em concorrência directa com os Estados Unidos da América, tiramos, de imediato, as dúvidas.

(Claro que, para que tal aconteça, tem de haver cúmplices internos que lhe permitem realizar o que o regime norte-americano está a por em marcha. E isso tem de ser denunciado e ultrapassado com uma mudança radical na situação política e económica na UE).

2 - Retrocedamos umas largas décadas, e, iniciemos uma breve análise histórica sobre o que sucedeu, logo após o término da II Grande Guerra.

Em 1941, os EUA foram atacados pela Força Aérea japonesa na base norte-americana de Pearl Harbour, Hawai, no que é considerado, oficialmente, como o acto que levou à declaração de guerra daquele país contra as potências do eixo (Alemanha, Itália e Japão).

Os Estados Unidos, apesar da violência da expansão nazi na Europa e em grande escala no Extremo Oriente desde 1939, através do imperialismo japonês, mantiveram uma política negocial próspera de apoio à implantação hitleriana, que já vinha do início dos anos 30 do século passado.

(Igualmente, a então União Soviética procurou distanciar-se do confronto inicial entre a Alemanha de Hitler e a Inglaterra e França, embora sabendo que o objectivo hitleriano era a expansão para Leste. Por isso, procurou limitar, egoisticamente, essa pretensão hitleriana assinando, ainda 1939, o chamado pacto Ribbentrop/Molotov).

Os EUA, somente, entram na guerra europeia, em 1943, através da invasão da Sicília, quando os Exércitos da União Soviética marchavam já em direcção à  Alemanha, com a retirada contínua da Wehrmacht, da União Soviética e dos países do leste europeu. E a derrota do hitlerismo era uma evidência.

A invasão da Sicilia só aconteceu em 1943

A preocupação das principais potências aliadas – EUA, União Soviética, Inglaterra - desde 1944 foi a divisão de influências sobre a Europa, e, não sobre outra qualquer região do Mundo em guerra, nomeadamente no Extremo-Oriente.
Tal objectivo foi, aliás, decidido em Ialta, a 1 de Fevereiro de 1945. Pouca atenção foi dada, então, pelas potências vencedoras, aos interesses nacionais.

A recuperação da Europa pós-guerra foi feita sob a supervisão de duas superpotências económicas e militares e sob dois modelos de capitalismo: o liberal pró-ocidental e o de capitalismo de Estado tipo russo.

Os Estados Unidos da América, que, com a guerra, da qual estavam, internamente, afastados e, por isso, não sofreram uma devastação produtiva, tiveram um incremento enorme da sua indústria – esta duplicou desde o fim da grande depressão - e do seu comércio.

O entesouramento capitalista norte-americano (em ouro e capitais) foi substancial nos finais dos anos 30 e durante a II Grande Guerra.

Aquele permitiu o financiamento abundante à Europa ocidental, através do *plano Marshall*. E este território estava inserido numa dinâmica de quem dominava o mercado mundial.

Nesta parte parte europeia, apesar da destruição produtiva, a evolução capitalista era, incontestavelmente, superior à parte oriental. 

Por seu turno, a União Soviética confrontava-se com um capitalismo em subdesenvolvimento e, principalmente, semi-destruido pela violência descomunal da guerra.

O campesinato e a pequena burguesia eram dominantes em toda o território oriental europeu.

A Europa ocidental percorreu a sua reindustrialização e evoluiu no seu comércio.

Embora permanecesse interligada ao capital financeiro de Wall Street, a burguesia local, a partir do seu centro industrial mais desenvolvido e dinâmico nos anos 60 do século XX, ganhou autonomia.

E esta autonomia foi conseguida, porque essa burguesia sabia que o caminho do seu incremento era a criação de espaços maiores territoriais, sem entraves fronteiriços e alfandegários, onde pudesse ampliar a sua capacidade de crescimento.

Para que este crescimento fosse consolidado era necessário um avanço para uma organização económica e política estatal com inter-relacionamento harmónico entre Estados nacionais.

A União Europeia adquiriu pujança, criou uma moeda única que estava a ser referência mundial ao dólar em decadência. A sua constituição como espaço económico e político é a baliza operativa para novos modelos de estruturas, como o MERCOSUL, a União Africana, justamente, todos eles em concorrência com os EUA.

O que foi conseguido até à crise de 2007.

3 – O primeiro indício de destabilização da União Europeia (UE) surgiu, em 1991, com a chamada guerra da independência da Croácia, que vai fragmentar toda a Jugoslávia ate 2001.


Curiosamente, o busílis desta guerra tem o centro no nacionalismo (que germinou, aliás, incipientemente, nos territórios da Voivodina e Kosovo nos anos 80, sendo jugulado).

O interesse pelo separatismo croata foi fomentado, logo no seu início e no imediato, pelas classes dirigentes de três potências – EUA, Alemanha e Santa Sé -, as quais, aparentemente, teriam interesses geo-económicos e geo-estratégicos diferenciados: o primeiro pela penetração castrense, via NATO, para atingir a Rússia e o Médio-Oriente, a Alemanha, que, no seu imaginário expansionista, ainda pensa no Sacro Império, e o Vaticano na consolidação católica.

Tudo isto contra a consolidação política da UE.
Nacionalismos esses que se fazem «ressentir», ainda nos dias de hoje, com os migrantes islâmicos e africanos.

Todavia, a questão central que mais abala a UE desde 2007 é, na realidade, a crise financeira, que se interligou com a económica, que começou, estrondosamente, nos Estados Unidos com a especulação imobiliária e a falência bancária e de companhia de seguros, e, rapidamente *exportada* por Wall Street para a União Europeia.

E abala, porque, desde então, as clivagens de desenvolvimento económico se acentuaram, com as grandes burguesias financeiras inglesa, francesa e alemã, umbilicamente ligadas ao capital norte-americano.

Embora a UE, através da intervenção do Banco Central Europeu, tenha conseguido implementar um mecanismo de estabilização financeira (MEE), que evitou, no imediato, o colapso da União, o certo é que se alargou um fosso na cooperação que existia desde a criação do espaço europeu.

Por onde pretende entrar mais em força o poder norte-americano.

Mas, a pressão económico-financeira do capital especulativo norte-americano não pára. Ele está sempre presente através de *armas* de ataque sistemático. Caso das agências de rating: que são exactamente três, a Moody´s, a Standard&Poor e a Fitch.


São elas que estão particularmente atentas a qualquer evolução positiva da UE ou dos seus Estados-membros.

Lançam logo as avaliações mais escabrosas sobre as suas economias.

Mas, dos EUA, nada.

As agências de rating têm sido acusadas de falharem na avaliação credível e independente de certos investimentos. Falharam, por exemplo, na altura da crise financeira que começou nos Estados Unidos com avaliações elevadas no sector imobiliário. Mas também com a Islândia que entrou em bancarrota quando tinha uma avaliação elevada. Em resultado disso, tanto nos EUA como na Europa, as agências de rating começam a ser questionadas estando mesmo a ser reavaliada a sua regulação. Em resposta, as agências alegam que as notas que dão são apenas opiniões que os mercados podem ou não aceitar.

Quando a economia norte-americana se afundou em 2007/08 com as mais repugnantes especulações e falências bancárias. Onde se encontravam aquelas com a sua *avaliação credível e independente*?.

Não tinham a *percepção* do que se estava a passar, foi uma das explicações que se apresentaram.

E na Islândia, que entrou na bancarrota com a falência dos principais bancos, que, por acaso, mantinham ligações a Wall Street e à City londrina?

Silêncio absoluto.

Afinal, quem detém realmente, as agências de ratings?

Retiramos da imprensa: *No caso das duas primeiras há um investidor em comum. A Capital World Investors é a maior accionista da McGraw-Hill, empresa que detém a S&P, tem uma participação de 12%, segundo dados da Bloomberg. Mas esta entidade financeira não se fica por aqui. É ainda uma das accionistas de referência da Moody's, com uma participação de 11,02%. No caso desta agência, o maior accionista é o multimilionário Warren Buffett. O "Oráculo de Omaha" detém 12,32% da Moody's, apesar de ter vindo a reduzir a sua participação.

Já a Fitch é controlada, teoricamente, por uma *holding francesa, a Fimalac, com 60% do capital, cujo Presidente se chama Marc Lacharrière. Este esteve ligado ao grupo Oreal, ao Banco Indo-Suez e ao Crédit Lyonnais, todos de capitais judeus.

Ora, uma das accionistas de referência da Fimalac é a multinacional norte-americana gestora de fundos Fidelity, com uma posição de 5,39%. Esta empresa financeira controla ainda 7,57% da Moody's.

Onde se sente com mais acutilância a interferência norte-americana nos assuntos europeus é nos países do leste integrados na UE (Lituânia, Estónia, Letônia, Polónia, Eslováquia, Bulgária, República Checa e Hungria).

Todos eles foram empurrados para entrar rapidamente para a União, por pressão dos EUA, e sob a supervisão da NATO a que aderiram sem olhar a eventuais consequências para a própria segurança europeia, e, onde Washington estabeleceu tropas.

O fluxo anormal de refugiados vindos de países do Próximo e Médio-Orientes nos últimos meses não acontece por acaso.

Além das questões ligadas às guerras e devastações nos países daquelas zonas terrestres, que são reais e não podem ser escamoteadas.

Aquelas provocadas, essencialmente, pelas intervenções norte-americanas, com o apoio dos executivos governamentais seus serventuários da Europa ocidental, levaram à debandada de dezenas de milhões de pessoas em busca de refúgio nos países vizinhos, uma parte dos quais têm relações privilegiadas e de aliança com os Estados Unidos.

Porque não foram encaminhados, portanto, uma parte substancial desses deslocados e refugiados para os EUA, o sal da terra e o refúgio das oportunidades capitalistas?

Simplesmente, porque alguém que tinha muito dinheiro e meios para orientar *redes* organizadas que perpassam várias fronteiras para lhes dar uma indicação precisa para os países para onde se deveriam dirigir: Alemanha, Inglaterra, Suécia, Holanda, França.

Quem podem despender tais financiamentos a esses migrantes sem capacidades financeiras para pagar – cada um com uma média de 10 mil euros vezes cerca de um milhão de pessoas neste ano!!!?

4 – Finalmente, porque se está em cima do acontecimento a questão dos atentados em França.

Acontecem, justamente, quando a UE tem em mãos o problema de refugiados.

Pode-se argumentar que os prováveis jihadistas escolheram o elo mais fraco entre as potências que atacam o auto-intitulado Estado Islâmico.

Mas, o ponto fulcral é que os atentados não visaram apenas a França, mas a unidade política europeia.

A UE corre o risco profundo de voltar para as velhas fronteiras do nacionalismo serôdio e da competição sem tino inter-europeia.

Quem orquestrou realmente os atentados?