domingo, 6 de maio de 2012

GEO-ESTRATÉGIA: OS TEMPOS SÃO DE MUDANÇA RÁPIDA

1- Os grandes centros de informação e contra-informação do capitalismo financeiro internacional começaram a lançar "o isco" sobre a aplicação na Europa ocidental de um novo "plano Marshall",


(Em que consistiu o Plano Marshall? Lançado em 1947, pelo então secretário de Estado norte-americano George Marshall, tratou-se, na realidade, de um grande empréstimo daquele país, que "colonizou" os países europeus, que tiveram de se submeter a uma orientação económica, política e militar, tutelada de Washington. 


Oficialmente, chamava-se Programa de Recuperação Económica: Para os EUA tinham uma vigência de quatro anos fiscais, com uma capitação em dinheiro proveniente do outro lado do Atlântico, em troco de pagamentos de juros e compra de bens alimentares e matérias-primas, bem como tecnologia, máquinas, veículos, combustíveis. 


O valor investido pelos Estados Unidos rondaria, ao câmbio de hoje, um montante de cerca de 140 mil milhões de dólares. Na realidade, a grilheta continuou. O resultado prático ficou patente com a crise de 2008: submissão total do sistema financeiro europeu ao norte-americano, com o consequente cortejo de empobrecimento actual).


Conforme aceitaram o empréstimo amordaçante dos EUA, em 1947, um sector "pensante" da grande burguesia europeia - convém recordar que a França não aderiu ao Plano Marshall" - reflectiu, todavia, que as guerras de grandes proporções germinavam e alastravam, sempre, no território europeu, porque a Europa, embora fosse o centro revolucionário das grandes transformações societárias, era sistematicamente desmembrada, devastada, e traficada, a preço de saldo, pelas potências vencedoras, impedindo de construir o seu próprio destino e, em grande medida, forjar uma política económica independente, em particular na edificação do seu sistema produtivo industrial atractivo e autónomo.


Assim aconteceu com a repartição após o Congresso de Viena em 1815, assim sucedeu após a I Grande Guerra, em 1919, e estava a suceder, justamente, com o término da II Grande Guerra.


Ora, depois da guerra de 1939-45, perante o espectro de uma profunda revolta operária e popular, que começava a germinar na França (os guerrilheiros armados ligados essencialmente ao PCF - cerca de 120 mil -poderiam assumir o poder, e somente não o fizeram, porque foram desarmados por imposição da URSS, de Stáline e a cumplicidade dos dirigentes internos, como Thorez e Duclos, que aceitaram entrar para lugares menores de um governo de "salvação nacional", sob a hegemonia dos gaullistas), na Itália (a guerrilha do PCI era a maior força armada do país, e, sofreu igual imposição e submissão) e Grécia (em que grande parte do território era gerido desde 1944 por estruturas paramilitares do PC grego), o sector burguês capitalista avançado, liderado pelo gaulismo, sob a égide de um banqueiro, Jean Monet, fomentou, a partir de 1950, a ideia da busca da unidade económica europeia, em contraponto a uma total vassalagem ao imperialismo norte-americano, que contribuiria para o enfraquecimento político da própria burguesia, que se pretendia reerguer.


Assim nasceu, em 1951, a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA). Foram inspiradores o banqueiro Monet e o então ministros dos Negócios Estrangeiros francês Robert Schuman. 


Foi o caminho desbravado, embora por trajectos ínvios, por um lado, como uma pujante e crescente potência económica própria, por outro, optando por uma submissão servil ao capital financeiro especulativo e à supremacia militar dos EUA, para a constituição da União Europeia.


O peso que a União Europeia adquiriu, em particular desde os anos 80 do século passado, como a maior potência económica mundial, com uma única moeda, o euro, atractiva, na modelagem de um novo sistema comercial mundial, sofreu um rude golpe com a crise financeira norte-americana, e, a verificação de quão nefasta foi submissão financeira e militar europeia.


Os EUA procuraram, com a crise de 2008, fazer ajoelhar, nova e completamente, a UE aos ditames imperiais de Washington, realizando o mais feroz e concentrado ataque, através de Wall Street, com a cumplicidade descarada da City londrina (e dos sequazes políticos das finanças judias dos dois lados do Atântico, como Blair e Cameron), à unidade e formação europeia.


Apesar das incertezas e falta de uma perspectiva progressista de contra-ataque, a UE conseguiu refrear o ímpeto destruidor desta ataque especulativo, e, embora embrulhado em tibiezas e com lideranças pró-americanas em muitos Estados, como por exemplo França, Alemanha, Espanha e Itália, um sector mais esclarecido da burguesia, pressionado pela possibilidade real de um revolta e provável convulsão revolucionária das classes trabalhadoras, procura colocar de pé um caminho político que faça redefinir a criação de uma nova unidade europeia, livre dos entraves alfandegários, fiscais, e políticos nacionais, e, principalmente das amarras do capital centrado em Wall Street e na City londrina.


O que a vingar, colocará por terra a ideia, agora lançada, pelo agiotas especuladores, de um novo "Plano Marshall". Até porque as economias dos EUA, e dos seus mais firmes aliados, como o Reino Unido e o Canadá estão em recessão ou para lá caminham.


Dentro da própria estrutura militar da Europa, associada à NATO, sob a hegemonia norte-americana, está a esboçar-se, com maior rapidez, um projecto de uma "componente autónoma" europeia, projecto este que surge num novo contexto de mudanças geo-estratégicas no seio da União Europeia, consolidadas por eleições que possam fazer aplicar, uma nova orientação económica-estratégica de movimentações comerciais e financeiras em sintonia com os chamados países emergentes, desde a Rússia até à China, passando pela América Latina, através da preponderância do Brasil.





2 - Na parte final do mês de Abril, três das actuais grandes potências, EUA, China e Rússia, exibiram a força "muscular" castrense na área marítima do Mar Amarelo.


O pretexto foi um "pequeno incidente" numa das ilhotas que compõem o arquipélago de Spratly (ilhas, recifes e bancos de areia), cuja soberania é reivindicada  por seis países (China, Taiwan, Vietname, Brunei, Malásia e Filipinas).


(Este arquipélago com mais de 40 ilhas e ilhotas tem uma posição estratégica de controlo de rotas marítimas comerciais e potenciais jazidas de petróleo e gás natural).


O incidente iniciou-se quando um navio de guerra filipino encontrou uma embarcação de pesca a fainar junto ao banco de areia de Scarborough (Huanggyan, na terminolia chinesa) e pretendeu deter os pescadores. 


A China, de imediato, enviou navios da sua Guarda Costeira, que cortaram as veleidades dos filipinos.


Os EUA, pressurosos, mandaram para a região vários vasos de guerra, com uma grande unidade de fuzileiros, alegando "a existência de uma parceria militar" com as Filipinas. 


Simultaneamente, mandou os seus vassalos do Pacífico - Japão, Austrália e Coreia do Sul, zarpar para a zona para efectuarem "manobras navais conjuntas".


A China, pouco se intimidou:  fez embarcar em vários navios, mais de quatro mil membros das suas tropas especiais, e, juntou uma esquadra de 16 navios (cinco contratorpedeiros, cinco fragatas e cinco patrulhas, todos equipados com misseis e preparados para a luta anti-submarina, bem com um navio de apoio logístico, a que junto depois um navio-hospital). Inseriu ainda uma frota aérea de 13 aviões e cinco helicópteros de combate.


A novidade é que esta demonstração de força chinesa foi efectuada em manobras aero-navais conjuntas com a Rússia, que ali colocou grandes navios de guerra da sua Esquadra do Pacífico (o cruzador equipado com mísseis de longo alcance Varyag, duas fragatas equipadas para a luta anti-submarina (almirante Vinogradov e marechal Chaposnikov, bem uma outra da esquadra do Norte, a almirante Tribuz, unidades estas que se fizeram acompanhar dos navios de apoio MB-39 e Pechenga).


E os dois países fizeram questão de sublinhar que estavam em manobras no âmbito - e com o consentimento - dos países do Conselho de Cooperação de Xangai, dos quais fazem parte, e que junta ainda o Quirguistão, Tadjiquistão e Uzbequistão, que tem como observador permanente o Irão.


O que é que isto pode significar e o que, realmente está a suceder, na minha opinião, está ligado a toda a rápida mudança geo-estratégica mundial.


A desagregação, em 1991, do complexo imperial da ex-União Soviético, submetido ao capitalismo de Estado, embora imbricado no nome do comunismo, trouxe para a ribalta os Estados Unidos da América, que foram considerados com os "campeões da democracia" e seu tornou, na realidade, a maior potência capitalista dirigente do Mundo.


Para muitos, era a referência máxima da implantação de um regime de paz, liberdade, direitos humanos e bem-estar social.


O regime imperial norte-americano "deificou-se" como o ídolo perfeito da burguesia europeia na parte final do século XX.


Mas, essa euforia de "salvação da paz social mundial"  foi sol de pouca dura. Os EUA instituíram-se como propagandista fanáticos do "império capitalista da democracia". 


E fomentadores, sem nó nem piedade, da aplicação prática da sua "doutrina político-económica-religiosa" o estilo bárbaro do seu "farwest" a ferro e fogo. Teve, todavia, um sucesso momentâneo, ela está fracassar redondamente.


Em nome de uma política de violência de ferro e fogo, os EUA - em cumplicidade directa com a Alemanha e o Vaticano - fomentaram a carnificina que atravessou, em toda a década de 90, os Balcãs, chegando em 1999, utilizando a estrutura criminosa da NATO, para bombardear, pela primeira na Europa, após a II Grande Guerra um Estado soberano, a Jugoslávia.


Em 1991, invadiram, a ferro e fogo, pela primeira o Iraque, situação que repetiram na década seguinte com a ocupação sinistra e sangrenta do mesmo país, que se mantém até agora, com o velho argumento de um "inimigo" que se chamava "bomba atómica" que não existia. 


Em 2001, utilizaram um não esclarecido, sofisticado e embrulhado ataque às chamadas Torres Gêmeas por um organização que eles montaram na década de 80 do século passado, chamada Al Qaeda, cuja sede real se situa na Arábia Saudita, para desencadear um assalto pirata ao Afeganistão para controlar rotas geo-estratégicas e mananciais de matérias-primas. 


Puseram em guerra permanente toda a África Central (Uganda, Ruanda, República do Congo, Nigéria e Angola) para sacarem, através de "senhores da guerra" os beneficios de uma maior barateza de grandes riquezas, como o coltan, os diamantes e o petróleo, para não falar no urânio.


Cerca de 20 anos depois, tudo está a mudar na cena económica, política e militar internacional.


Entraram com uma arrogância imperial sem qualquer classificação no golfo Pérsico, mas estão a actuar, agora, com paninhos de lã, quando se constata que se está numa situação de pré-guerra, cuja vitória real pode não lhes ser favorável.


E isto porque, na realidade, a novo novelo de alianças se está a mudar e a fazer finca-pé sobre os apetites imperiais de Washington.


A Rússia armadilhou com sofisticados meios de alta tecnologia militar, que incluiu bombas nucleares toda a região do Mar Cáspio, nas próprias costas do Irão, com a conivência deste e o assentimento directo de Pequim, que pressupõe igualmente toda uma superestrutura industrial  de escoamento de petróleo e gás, que, a vingar, retirará grande parte desses produtos da passagem pelos países do golfo.


Por outro lado, desenha-se - ou está a desenhar-se - na Europa uma nova orientação política e económica que assenta numa maior parceria com os chamados países BRICS, o que implicaria uma troca comercial e cambial, que poderá colocar, num prazo relativamente curto, em perigo o facto de o dólar ser a medida de referência de troca mundial. 


Não é uma perspectiva, é um caminho que já rola com certa velocidade.


Os tempos estão realmente a mudar. 


Os progressos castrenses já não são apenas univocos: Os Estados Unidos ainda sendo a principal potência militar, já não é o "centro" decisivo dessa capacidade. 


A arrogância norte-americana obrigou todos os grandes Estados de diferentes partes do Mundo a dar saltos tremendos na sua própria tecnologia castrense. 


E os senhores de Washington para tentarem fazer-lhe frente, avançaram, como "baratas tontas" em várias direcções, fazendo explodir exponencialmente os seus encargos militares, que os atolam agora até ao pescoço. 


A questão castrense nos EUA tornou-se, praticamente, desde os tempos de Reagan, no fim principal da política de Estado dos Estados Unidos da América. 


Ora, esta ascensão dos falcões militaristas - civis e militares - corroem, de tal maneira, as despesas norte-americanas, que as estão a fazer cair num abismo.


Parte da crise financeira de 2008 está, justamente, relacionada com esta voragem gastadora, sem retorno, nas instituições e encargos militares. 


E o "establishment" norte-americano sabe disso, mas também está a ser pressionado por essa realidade para andar para frente. 


Estão a perder o pé. E podem dar um passo em falso, caminhando para a guerra. Só que os actores no palco mundial já são muitos e estão em vais de lhe fazer frente. Qual vai ser a saída?


3 - O que vai determinar, nos próximos anos, a grande viragem política e geo-estrátégica é a o princípio da verdadeira realidade que terá de evoluir num futuro não muito distante: a constituição de novas potências económicas que estão a emergir no pós-industrialização. 


Quem conseguir ter em mãos os grandes instrumentos económicos de uma nova industrialização centrada no seu próprio território será a força dirigente de uma nova sociedade que quer vir à luz do dia.

1 comentário:

  1. Diz-me uma coisa, dado que a maior parte dos acontecimentos narrados se passaram nos anos mencionados, ainda antes, durante e após a queda da URSS: só tiveste conhecimento deles agora? Foi pena, denunciados na altura teriam tido muito mais impacto, embora mais valha tarde do que nunca...
    E é pena que tão pouca gente se interesse por se informar. Penso, pensando em muitos que me rodeiam, que ouvem ou não descodificam as mensagens que o império faz entrar nos nosso ouvidos a cada passo... Assim as mudanças levam muitos mais anos. É esquisito como é que queremos e não queremos ao mesmo tempo.

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