1
– Os Estados Unidos da América, que, desde a II Grande Guerra, andam por todo o
Mundo a expandir, pelo poder das armas, a sua visão de império «democrático», confronta-se
agora com a candidatura presidencial do Partido Republicano, representada pelo especulador
capitalista Donal Trump, que anuncia que, se for vitoriosa, haverá uma
retracção do seu dispositivo expansionista castrense, bem como um corte com os
tratados comerciais internacionais.
Na
realidade, nestes 60 anos, os EUA semearam pelo mundo pequenas e médias
guerras, desprezando e trucidando os direitos nacionais de Nações, países e
povos.
Eis
os principais, para que conste:
Indochina
(1946–1954), Coreia (1950–1953), Laos (1953–1975), Líbano (1958), Vietname
(1959–1975), Baía dos Porcos (1961), República Dominicana (1965–1966),
Camboja (1967–1975), Chile
(1973), Brasil (1964), Argentina (1976), Bolívia (governos militares –
1964/82), Venezuela, Perú, Equador, Uruguai, conflito cambojano-vietnamita (1977–1991),
Líbano (1982-1984),
Granada (1983), Panamá ocupado pelos Estados Unidos em
1989, Golfo (1990–1991), Iraque ( desde 1991), Somália (desde
1992), Haiti (1994), Bósnia, 1994, Jugoslávia, Kosovo (1998–1999), Afeganistão
(desde 2001), Noroeste
do Paquistão (desde 2004), Iémen (desde 2010), Líbia
(desde 2011, Síria (desde 2011).
Neste
período, a classe dirigente norte-americana construiu ao redor do planeta um
sistema colonial gigantesco de bases militares, na realidade, fortes comerciais
de rapina de matérias-primas.
Segundo
o Pentágono, dados de 2005, existiam 865 bases nos mais diferentes locais, desde
a Europa à América do Sul.
Não
estavam contabilizadas as que vieram, entretanto, a surgir pelo Médio-Oriente
(Afeganistão, Paquistão, Iraque, Kuwait, Qatar, Kosovo, entre outros).

O
militarismo expansionista custa dinheiro.
Pelos
dados recolhidos, em diferentes órgãos de imprensa, os EUA gastam anualmente
entre 100 mil e 120 mil milhões de dólares com toda a logística das suas bases
no exterior. (Não contabilizando as disseminadas pelo Iraque, Afeganistão e
Paquistão).
Aparentemente,
deveria ser o preço *controlado* da manutenção imperial, como vinha sucedendo.
Então
porque as ameaças contra os aliados da NATO, em especial os europeus, de os
deixar «ao deus dará»?
Então,
porque a ameaça de saída da Organização Mundial do Comércio (OMC), criada sob a
liderança e pressão do capital financeiro norte-americano para penetrar nos
mercados internacionais?
Então,
porque a ameaça de não subscrever os acordos de livre troca comercial, como o
Tratado Transpacífico (TPP), justamente elaborados para relançar o poder das
multinacionais norte-americanas em supremacia face aos Estados?
2-
O desmoronamento da antiga União Soviética colocou os Estados Unidos da América
no lugar da potência dirigente do Mundo, e, especial da Europa, que estava
dividida, desde a II Grande Guerra, na vassalagem por dois blocos: a NATO e o
Pacto de Varsóvia.
Essa
desagregação lançou, na altura, para a agenda mediática um analfabeto,
vira-casacas e informador policial chamado Ronald Reagan, que foi colocado no
poder presidencial pelo capital financeiro.
(Claro
que tal facto, para a História, já, agora, é, apenas, uma notícia de rodapé em
letras pequenas).
Mas,
na altura, Reagan transformou-se um ídolo da grande burguesia financeira,
+deificado+ pela chamada «ideologia neocons», através dos orgãos de informação
de Wall Street (ABC, Fox, CNN, CNBC).
Não
porque liderou a «luta» pela desagregação soviética, mas, porque elevou o
sistema de império +democrático+ a modelo de dominação do mundo.
Na
realidade, Reagan era o produto acabado da imagem arrivista e superficial da
grande burguesia financeira.
(Como
o foram os seus sucessores numa cínica *alternância democrática* entre facções de Wall Street).
E
ele foi o arauto propagandista no chamado mundo ocidental, em como, sob as
bandeiras progressistas das eleições universais e dos direitos humanos, se
podem constituir governos sufragados de oligarquias financeiras.
Em
que a especulação bolsista, as fraudes criminosas com as transferências
bancárias e as deslocalizações industriais, eram a matérias primeiras para a
exploração e opressão desenfreada das classes trabalhadoras.
Tudo
serviu para lançar as garras imperiais democráticas pelo Mundo.
Mas,
este sucesso de uma política expansionista a todo o custo, com o pau e a
cenoura, teria de bater na parede.
Progressivamente,
a expansão, ocupação e exploração capitalista imperial norte-americana foi
desenvolvendo um forte sentimento de reacção nacionalista e anti-imperialista ,
que, em certos casos, geraram mesmo revoluções, algumas caminhando, par a par,
com um programa socialista entretanto degenerado.

Com
o desfecho da II Grande Guerra, ao mesmo tempo que, pelo planeta, se começava a
forjar um movimento anti-colonialista (Índia, Paquistão, China, Vietname, entre
outros), a burguesia dos países europeus mais massacrados pela destruição
violenta lançou-se num processo de industrialização comum, que enquadrou, mais
tarde, um novo tipo de constituição de uma formação estatal transnacional.
E
tal caminhada, embora fosse realizada em ligação profunda com o capital
financeiro norte-americano, com a crise geral de 2007/08, que se prolonga até
hoje, levou a União Europeia, atolada nessa mesma crise, a fazer uma
decantação, ainda bastante ténue, é certo, cujo rumo geopolítico, a tem levado
a um afastamento do centro financeiro da City londrina, filial de Wall Street,
com o reforço do Banco Central Europeu (BCE) em Frankfurt.
O
que, por seu turno, em termos militares, irá cavar, cada vez mais, uma clivagem
(ainda muito subterrânea) com a NATO/EUA.
Na
América do Sul, onde, ao longo dos últimos 100 anos, se deram conflitos
violentos, por vezes, com cariz revolucionário, contra a suserania e ocupação
norte-americanas, a burguesia *progressista* social-democrata e liberal,
decalcando do modelo europeu, iniciou, ainda, nas últimas décadas do século
passado, um processo de integração económica dos respectivos países, que
apelidou de MERCOSUL, indo até mais longe, forjando um princípio de Exército
único, com o UNASUL.
Abertamente,
contra a hegemonia ianque.
Mereceu
o apoio directo da UE, e a hostilidade, primeiro latente, hoje, já aberta dos
EUA, através da grande burguesia *criola*, vinculada a Washington, cujos
efeitos se começam a sentir.
3
– É, pois, o aparecimento de espaços geoestratégicos (que são também
geoeconómicos) em concorrência com o papel hegemónico dos Estados Unidos, que
está a preocupar a grande burguesia norte-americana.
A
principal preocupação concorrencial de Washington, não é, propriamente, no
imediato, a UE e o Mercosul, mas o espaço geoestratégico, que se está a
materializar em enquadramento político, económico e militar, formado pela
Organização para a Cooperação de Xangai.
Criada,
formalmente, em 1996, sob a égide da China e a Rússia, que enquadra ainda,
presentemente, Cazaquistão, Quirguistão, Tajiquistão, Uzbequistão, Índia e
Paquistão, que tem, ainda, como observador o Irão.
Eles
colocaram de pé já um grande banco (Novo Banco de Desenvolvimento) e está em
estado avançado a substituição do dólar, como moeda referencial universal de
troca.

Este
conjunto de países representa mais de 60 % do território terreno e 50% da sua
população, controlando uma parte substancial das matérias-primas do planeta.
O
busílis da questão está no confronto concorrencial: Rússia e China têm
capacidade militar capaz de fazer valer a sua diplomacia e incrementar,
independentemente, a sua economia.
Estão a fazê-lo utilizando a seu favor, o livre comércio, que a OMC lhes
proporcionou.
Aproveitando,
justamente, as fraquezas internas da economia dos Estados Unidos.
Claro
que o maior mercado comercial do Mundo, neste momento, continua a ser a UE.
E,
tal facto tanto o é para os EUA, como para a Rússia e para a China.
Mas,
a UE para se fortalecer e relançar o seu desenvolvimento necessita de alargar
as suas exportações para fora do seu território.
A única cobertura que utilizam na sua política externa é o manto da NATO.
Ou
seja, a sua diplomacia fica travada nos interstícios dos interesses primeiros
dos norte-americanos. Nem têm, portanto, as suas forças armadas conjuntas.
Para
que a Europa seja uma força unida política, além da sua construção interna em
harmonia, sem pôr em causa os sentimentos nacionais, requer um Exército único.
Este
tornou-se, na actualidade, uma necessidade económica.
Por
enquanto, esta UE, a principal potência comercial do Mundo, está amputada,
permanece um campo de disputa, principalmente entre os EUA e a Rússia. Os
primeiros ocupam-nas. A segunda precisa dela para aumentar as suas capacidades
exportadoras e de incremento económico.
Mas,
para a Europa, a Rússia é um território natural e essencial para a caminhada da
burguesia no sentido da sua verdadeira unidade europeia, sem fronteiras, sem
entraves alfandegários e sociais, na circulação de mercadorias e força do
trabalho.
A
supremacia da UE, no presente, face à Rússia está na sua capacidade produtiva e
desenvolvimento tecnológico.
A
Rússia deu um grande salto, nos últimos 20 anos, na sua força produtiva,
incluindo a armamentista, depois da decadência constante da fase final do
império soviético, e da desarticulação e marasmo que se seguiu com o período de
Boris Ieltsin.
É
potência militar que ombreia com os EUA. Mas a economia produtiva não
acompanhou, ainda, a indústria de ponta do armamento.
É,
neste contexto, que a UE se torna o território mais frágil no confronto entre
duas grandes potências castrenses, armadas até aos dentes.
É
+um campo de batalha+ militar preferencial, se se desorganizar, se se desunir,
se não souber impor a sua verdadeira força.
A
única potência dominante, essa, já não o é.
4
– A concorrência acirrada entre potências militares custa dinheiro. E cada vez
que se evoluciona no domínio de conseguir armas cada vez mais sofisticadas, mas
sempre mais caras, tal facto leva a um espiral de despesa pública, que somente
poderia ser minimizada se a produção industrial e comercial interna acompanhar
a sustentabilidade dos orçamentos militares.
Esse,
hoje, é o calcanhar de Aquiles do regime norte-americano. Os EUA perderam a sua
hegemonia industrial, e economia retraiu. A falência paira sobre a capacidade
produtiva.
Embora aquela seja, ainda, aparentemente, elevada.
Os
Estados Unidos da América têm a maior dívida pública do mundo em crescimento,
e, com o dólar a enfraquecer: 19,268 biliões
de dólares, 102% do PIB.
As
receitas – valores de 2014 – atingiram os três biliões de dólares, mas as
despesas atingiram os 3,5 biliões.
As
exportações trouxeram ao país 1,62 biliões de dólares, mas importaram 2,35
biliões em 2014.
A
pobreza aumentou. Cerca de 15 % vivem mesmo abaixo do seu limiar, segundo dados
de 2013.
Embora
os censos oficiais coloquem os valores do desemprego nos 5%, este valor aumenta
significativamente nos antigos centros industriais. O certo é que os mesmos
censos assinalam que a oferta de emprego não aumentou em valor estável desde a
crise de 2007/08. Os salários estão estagnados há cerca de 10 anos.
O
grande problema, para a grande burguesia norte-americana, é, portanto, o
enfraquecimento da sua produção interna.
A luta
de classes que está no interior da actual disputa de candidatura presidencial
liga-se, justamente, ao facto de ter aumentado a crise económica e financeira
na sociedade norte-americana.
Os
de baixo estão a manifestar-se contra a lúmpen grande burguesia financeira. Trump
e Sanders apontaram, precisamente, o dedo à sua representante mais
mediaticamente comprometida com Wall Street, Hillary Clinton.
Sanders
cedeu, como social-democrata que é, Trump – ele próprio um arrivista criminoso pertencente
esse lumpen financeiro, critica o sistema para conseguir diluir esse descontentamento
no seio da sua política, que vai ser o da repressão fascista contra os
desfavorecidos, quer sejam proletários brancos, quer de minorias negras, árabes,
ou hispânicas.
Sobre
a propaganda sonora contra o sistema, Trump é, portanto, o representante
fascista do capital financeiro (precisamente como o foram Hitler e Mussolini na
Europa). Claro que o regime norte-americano não terá o carácter imediato violento
do sistema nazi-fascista dos anos 30/40 no continente europeu.
5 –
O programa político de Trump, que, até agora, não foi formalmente divulgado,
para dar consistência aos seus slogans dispersos, terá de assentar numa via de
criar algum emprego, ou seja numa base de recuperação industrial ou pós
industrial, com eventual regresso de empresas que foram deslocadas para países
estrangeiros.
Ou
seja, em termos de economia burguesa, falar em proteccionismo. Tal aposta irá
colidir com uma política de exportação, essencial para a expansão imperialista
norte-americana.
Colidirá
tal política com os tratados comerciais internacionais. Para os pôr em causa,
uma eventual administração Trump, se for eleita, terá de desarticular os
grandes espaços comerciais internacionais concorrenciais, em particular os elos
mais fracos , em termos de segurança castrense, nomeadamente, a União Europeia, e
o MERCOSUL.
Estará
a saída do Reino Unido da UE inserida nessa estratégia da grande burguesia
norte-americana? E a tentativa de desintegração do MERCOSUL, a partir da
Argentina, do Brasil e da Venezuela seguirá já essa estratégia?
Se
tal suceder, o regresso do «proteccionismo» acirrará as contradições
inter-imperialistas.
O
que em termos práticos, a médio prazo, significará guerra.
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