segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

LEILÃO DA DÍVIDA PORTUGUESA: NAS MÃOS DOS ESPECULADORES










1 - Com trombetas e os habituais comentaristas residentes, apanhadores das migalhas do Orçamento de Estado nos grandes meios de comunicação social, o governo português anunciou que estava no trilho certo ao colocar, na semana passada, para venda, títulos de dívida pública (bilhetes de Tesouro) no valor de dois mil milhões.

Fez este leilão em três fases: a três meses (300 milhões de euros), 12 meses (1.200 milhões de euros) e a 18 meses (1.000 milhões).

Formalmente, quem colocou a venda da dívida foi o Estado português, via governo.

Na realidade, o leilão foi todo ele controlado e efectuado por quatro bancos, três estrangeiros declarados, Barclays, Deusche Bank e Morgan Stanley e, um português, detido, na prática pelo Crédite Agrícole francês, o BES.

As trombetas serviram para fazer ruído, para obscurecer que a dívida pública está nas mãos do sistema financeiro especulativo e o dinheiro arrecadado é apenas para pagar juros da dívida existente, o que, na realidade, vai fazer crescer, novamente, essa mesma dívida.

//É um facto: o Estado português, ou seja o seu executor prático, o governo actual – e os anteriores – está de “calças na mão”, completamente à mercê da grande burguesia financeira mais vampiresca, o que, em termos práticos, o obriga a descarregar todo o ónus da despesa para cima das classes trabalhadoras e de grande parte da pequena burguesia para satisfazer os apetites crescentes da rapinagem dessa lumpem-grande burguesia.

A denúncia não é minha, está estampada na grande imprensa, que faz título de primeira página: “Dívida detida pelos bancos atingiu máximo histórico em Novembro” do ano passado.

Transcrevo a notícia de um jornal diário económico que é elucidativo: “A dívida pública portuguesa detida pela banca atingiu máximos históricos em Novembro de 2012, um recorde que os analistas atribuem ao financiamento barato (sublinhado meu) do Banco Central Europeu (BCE) que os bancos aproveitam para aplicarem em dívida com elevada rentabilidade.

“Os bancos a operar em território nacional tinham, em Novembro do ano passado, 32.499 milhões de euros de títulos soberanos de Portugal. Este é o valor mais alto desde 1997, primeiro ano de que há registos do Banco de Portugal, e ultrapassa em 39% o valor de Abril de 2011, quando os presidentes dos maiores bancos portugueses sugeriram que Portugal devir pedir ajuda externa e alertaram que o sector não podia continuar a financiar o Estado através da compra dos títulos de dívida.



“Após esse mês, a dívida soberana nas mãos dos bancos ainda subiria ligeiramente, mas na segunda metade do ano iria descer e chegaria aos 22.847 milhões de euros no final de Dezembro de 2011. Desde então, a tendência é de subida.



“De acordo com os analistas, o aumento da dívida nas carteiras dos bancos é o resultado de dois factores. Por um lado, da percepção de que a dívida portuguesa estava subvalorizada no mercado e, por outro, da capacidade financeira dada pelas operações de financiamento a três anos do Banco Central Europeu (BCE), que permitiram aos bancos ter capital para investirem em títulos soberanos e realizarem mais-valias.



“Nas duas operações de financiamento do BCE (em Dezembro e Março, à taxa de 1%) os bancos portugueses ficaram, no total, com 40 mil milhões de euros do bilião de euros concedido à banca da zona euro.



“Em Setembro, segundo os últimos dados dos principais bancos privados, 16% dos activos do BPI eram títulos de dívida soberana, os quais ascendiam a 7.462 milhões de euros. Destes, mais de 80% era dívida de Portugal (6.073 milhões de euros).

No BCP e no BES a dívida soberana era de cerca de 5% dos activos em balanço.



“No entanto, em termos do total de títulos soberanos, os números são ainda mais significativos: 95% do total no banco liderado por Nuno Amado (4.788 milhões de euros) e 98% no banco presidido por Ricardo Salgado (4.204 milhões de euros).

"Já a Caixa Geral de Depósitos (CGD), segundo a imprensa, tinha no final do primeiro semestre do ano passado 8,1 mil milhões de euros em dívida soberana de Portugal, isto em termos consolidados.

“Francisco Almeida, gestor de activos da corretora Orey Financial, considera que, além das remunerações elevadas, os títulos de dívida portuguesa são atractivos para os bancos porque têm a vantagem de "servirem como colateral para entregar ao BCE por empréstimos". 

“Mas não é só o financiamento do BCE que os bancos estão a utilizar para comprar dívida portuguesa.

“Paulo Soares Pinho, professor da Universidade Nova de Lisboa, refere também que parte importante do capital público que o Estado português tem injectado nos bancos é canalizada para dívida pública.

“Isto porque, explicou, o facto de os instrumentos de capital convertíveis em açcões (as chamadas 'CoCo bonds') serem "onerosos" (com taxas a partir de 8,5%) leva os bancos a utilizarem "esses montantes para comprar dívida pública de longo prazo, cujas 'yields' [rendimentos] elevadas permitem compensar o custo dos CoCos".

“Depois dos 4.500 milhões de euros injectados no BCP e no BPI em 2012 para os recapitalizar, até final deste mês o Estado vai pôr 1.100 milhões de euros no Banif, onde ficará como accionista. O Estado investiu ainda 1.650 milhões de euros na CGD, neste caso, enquanto seu único accionista.

“Os analistas encontram neste processo quase que um círculo vicioso que está, pelo menos de momento, a financiar tanto os bancos como o Estado.

"Os bancos estão a ir buscar fundos ao Estado em parte por força de terem exposição a divida soberana e com esse capital vão comprar mais dívida soberana. É um ciclo estranho, resolver apagar o fogo com mais lenha", afirmou o analista que prefere não ser identificado.

“Já segundo Soares Pinho, o "Estado encontra, via banca, uma fonte de financiamento estável", ao mesmo tempo que assiste a uma queda das taxas de juros da dívida pública através dessas compras. Já os bancos têm melhorado "bastante" a sua liquidez, o que lhes permite baixar as taxas de juro agressivas que chegaram a oferecer pelos depósitos a prazo, enquanto o BCE se mantém como uma fonte fundamental de financiamento”//.


Querem explicação mais clara?







2 -
E para onde foram esses títulos de Tesouro?

Diz a secretária de Estado do Tesouro, Maria Luís Albuquerque (como elas exercem, com mestria as funções capitalistas!!!) que 93 por cento da emissão foi colocada junto de investidores estrangeiros.

A linguagem de servidores da lumprem-grande burguesia: Maria Luís enaltece: a operação foi “um primeiro passo muito importante” no processo de regresso aos mercados, que contribuirá para a recuperação da economia e para o financiamento das empresas e famílias”.
E referenciou: cerca de 30% dos investidores são dos Estados Unidos, 30 por cento do Reino Unido, 9 da Alemanha e 7 por cento de Portugal. O complemento explicativo: mais de 60 por cento são gestores de fundos, ficando 22 % da dívida nas mãos de *hegde funds*, 9 % nos bancos e 4 % em seguradoras. 

Ou seja, os detentores são, essencialmente especuladores financeiros que querem sacar mais valias, o mais rapidamente possível à custa de juros apetecíveis, e estão a marimbar-se para qualquer recuperação da economia nacional, de Portugal ou de outro qualquer país. 

Muitos desses gestores de fundos são os accionistas reais do sistema financeiro internacional, principal de Wall Street e da City londrina. 

O que vai trazer esta dependência? 

Mais penúria financeira para o Estado, mais açambarcamento do dinheiro do erário público português, maior desequilíbrio do Orçamento. 

O crescente aumento da dívida pública cai sempre, em benefícios, para o sector da classe dominante avassaladora no momento actual – a grande burguesia financeira -, que enquadra, sem qualquer resistência todo o poder real, o executivo (governo e Presidente da República) e o legislativo, e, em grau menos esclarecedor, o aparelho militar e de segurança, bem como a magistratura. 

E conforme retiramos da própria grande imprensa da burguesia instalada no poder, o défice de Estado é a real raiz da especulação financeira e o factor principal de enriquecimento dessa burguesia financeira desclassificada e vampiresca. 

É impossível – em termos de economia política, que é essa que interessa à gestão do país – conseguir relançar a economia nacional (e em grande medida da União Europeia, por a interligação ser evidente e cada vez mais premente politicamente), sem fazer um equilíbrio justo do Orçamento de Estado, sem atingir, portanto, os interesses reais - e não meros aumentos de impostos de contas viciadas e irreais - dessa grande burguesia financeira, sem atingir, na realidade, os seus dinheiros encobertos, sem lançar mãos de impostos às fortunas dos banqueiros e similares incrustadas em off-shores.

Ou seja, sem arrecadar a verdadeira carga fiscal – a encoberta – dessa grande burguesia.





3– O governo de Passos Coelho, primeiro através do seu ministro das Finanças, Vítor Gaspar, posteriormente, pelo boca do Primeiro-Ministro, divulgou, solenemente, que o défice da contabilidade pública ficaria este ano nos cinco por cento, e que tal facto teria sido conseguido pela aplicação da política de equidade na austeridade que introduziram no país.

Ora, a realidade é uma outra: estes valores são alcançados, artificialmente, defraudando, sem qualquer espécie de rubor, o próprio Estado.

E onde estão as fraudes?

As aplicações constantes das chamadas obtenções de “receitas extraordinárias”, que nada são do que receitas de privatizações, no caso em apreço imediato a empresa ANA – logo delapidação do erário público e entregá-lo a especuladores – e de transferências de fundos de pensões, que são poupanças dos trabalhadores feitas ao longo do seu tempo de trabalho (no mínimo 36 anos de descontos), como foi o caso do fundo de pensões da Portugal Telecom, que serviu para injectar dinheiro nos bancos. Um valor, oficial, de pelo menos cerca de 9,2 mil milhões de euros.
Que, a prazo, vai entrar no défice do Estado.

Como se pode ver, existe uma cadeia no controlo total do domínio do capital financeiro.

Nada do que se está a desenrolar em torno da política de diminuição de défice traz vantagens para impulsionar a produção nacional, nem para servir, em último caso, o próprio interesse nacional, porque tudo o que está a ser transaccionável na esfera do Estado, desde as privatizações até ao investimento em chamadas Parcerias Pública Privadas, como forma de lançar dinamismo na economia, traz benefícios para as classes laboriosas atingidas. 

Tudo, mas tudo, na actualidade da sociedade burguesa, o que é grande negócio é especulativo, e quem domina, desde o aparelho de Estado até as empresas nacionalizadas privatizadas, e a sectores chaves, como a saúde, a educação, os transportes nas suas grandes vertentes, à própria propriedade da terra, são apenas uns: os banqueiros, os especuladores bolsistas, os grandes accionistas privados de empresas nacionalizadas rentáveis, que passaram para a sua posse.
Um facto novo, brutal, numa crise económica e política mundial que estava a larvar, progressiva, mas continuamente, desde 1973, altura do chamado *choque petrolífero*, foi o surgimento espectacular da crise da grande finança nos Estados Unidos em 2008. 

De olhos esbugalhados, a classe média norte-americana, e, essencialmente, as classes laboriosas viram-se, de um dia para outro, serem colocadas na rua, porque não podiam pagar as suas casas, os seus empregos desapareciam como por encanto, os seus seguros de pensões evaporaram-se, porque o capital financeiro especulara, desenfreadamente, com o dinheiro dos depositantes colocados à sua guarda. 

Esta crise rapidamente se transformou em crise económica, após a falência de uma dos maiores bancos privados dos EUA, o Lehman Brithers. 

Por tabela, e porque o capital financeiro está toda associado, dias depois a maior seguradora norte-americana a American International Group (AIG). 

Depois instalou-se o efeito dominó, empresas “tidas acima d qualquer suspeita” estavam na falência ou quase, Citigroup e Merryl Lynch (EUA), Northern Rock, Inglaterra, UBS, Suíça, e Société Générale, França.

Qual foi a principal preocupação dos governos, começando pelos Estados Unidos: injectar dinheiro público para salvar os bancos ligados ao grande capital especulativo (Wall Street e City londrina, curiosamente interligados ao capital especulativo judeu e do Vaticano). 

Esta realidade trouxe a contestação social generalizada para as ruas.

Começou a evoluir – ainda que sem grande orientação ideológica e política – conflitos de grande extensão, em particular na Europa, centro da grande evolução social e das rupturas políticas de envergadura ao longo dos séculos. 

Está em marcha um processo de luta, que vai ser prolongado, cheio de ziguezagues contra o domínio económico e político do grande capital financeiro.

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