quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

GOVERNO PS: PODE BAIXAR A DÍVIDA PÚBLICA SEM TAXAR OS CAPITALISTAS?

1 – O processo que antecedeu a formação do novo governo português (XX executivo constitucional), formado pelo Partido Socialista (PS), teve um cenário político digno de uma ópera bufa.

A 4 de Outubro passado, realizaram-se eleições legislativas em Portugal para formar a composição da nova Assembleia da República, de cujo conjunto de deputados sai o apoio ao futuro governo, bem como ao seu programa, sendo que a indigitação do primeiro-ministro cabe ao Chefe de Estado nos termos constitucionais.

Os resultados eleitorais deram a uma coligação constituída pelo Partido Social-Democrata (PSD) e Centro Democrático Social (CDS), denominada P´ra Frente Portugal (PAF), o maior número de votos, seguida do PS, Bloco de Esquerda (BE) e a coligação CDU, que enquadra o Partido Comunista Português (PCP), e um partido satélite daquele, chamado Partido Ecologista Os Verdes, PEV.

Todavia, a coligação PAF não conseguiu a maioria absoluta de votos na Assembleia.
O PS entabulou negociações com o BE e o PCP e o PEV para estabelecer um acordo imediato de governação, sendo que esses quatro partidos assinaram documentos para o fim a que se propuseram. Tornaram-se, deste modo, a formação maioritária parlamentar constitucional.

2 – Porque, então, todo o frenesim patético, mas ameaçador, do Presidente da República, dos dois partidos afastados do poder, do patronato, dos economistas do regime, de alguns dirigentes e deputados do próprio PS, bem como um secretário-geral de uma organização que se diz sindical, a UGT, sobre um novo arranjo governamental que se realizou dentro do sistema parlamentar e dentro das suas regras constitucionais?

Com o regime saído do 25 de Novembro de 1975, e, de maneira evidente a partir da privatização da banca e dos seguros, a grande burguesia financeira iniciou um processo de restabelecimento do seu domínio.

O primeiro impulso foi dado pela submissão dos governos do PS, em coligação com o CDS e depois com o PSD, sob a liderança de Mário Soares, aos ditames dessa grande burguesia financeira.

O domínio total foi forjado pelos governos do PSD, com Cavaco Silva primeiro-ministro e alicerçado, em crescendo, com os executivos de António Guterres, Durão Barroso, Santana Lopes, José Sócrates.

O governo de Passos Coelho e Paulo Portas foi o representante mais acirrado da vassalagem ao sistema financeiro de toda a estrutura produtiva do país.


Esta governação teve o condão de colocar na oposição todos os sectores da burguesia não dominante que foram totalmente marginalizados.

E que, em grande medida, engrossaram, ao longo dos quatro anos, o coro de manifestações e protestos organizados pelas classes trabalhadoras.

A grande burguesia financeira enquistou-se de tal maneira no poder político que, nestes últimos quatro anos, todos os processos de privatização foram entregues, de mão beijada, a esse capital, bem como o Estado retirou grande parte da riqueza nacional para recapitalizar os bancos (em 2012, o então ministro Gaspar anunciou os valores de 1.650 milhões para CGD, três mil milhões para BCP, 1,5 mil milhões para BPI); os *incentivos* fiscais às empresas ultrapassaram os mil milhões de euros. (Só em 2013, o executivo gastou 1,042 mil milhões. Diário Económico, 06/11/2014).

Dois bancos falidos, BPN e BPP, custaram ao Estado – logo aos portugueses trabalhadores – 2,7 mil milhões de euros (Tribunal de Contas) e 450 milhões de euros, respectivamente.

O Jornal de Negócios noticiava, em 17/09/2015 que cada português pagou cerca de 2.000 euros para *salvar os bancos*.

Ora, a nova maioria parlamentar, que sustenta o governo de António Costa, representa uma mudança na relação de forças entre um sector da grande burguesia que o PS representa e facções da média e pequena burguesia (BE e PCP), em parceria amorfa com as classes trabalhadoras, que pretendem impor pequenas reformas do sistema financeiro e fiscal que atingem ainda sem grande efeito, mas se consolidadas, uma parte da fonte da riqueza actual da grande burguesia financeira. Por exemplo, o financiamento da segurança social.

E, acima de tudo, porque esse rearranjo de governação poderá ter implicações na luta política em toda a União Europeia.

3 – Ao romper com a política dita de austeridade dos executivos submissos ao capital financeiro, o governo PS vai-se confrontar com a realidade política.

Para não ficar amarrado à austeridade que diz repudiar, com um peso crescente do défice público, o executivo de António Costa terá ir buscar dinheiro ao lado do capital.

Mas, como o poderá fazer, se, desde a sua indigitação como primeiro-ministro faz malabarismos para agradar à grande burguesia interna, e, principalmente europeia, através dos seus representantes políticos nas instituições da UE?



O equilíbrio das contas públicas passa por evitar a subida das dívidas do Estado e isso somente se pode fazer, no momento presente, pela taxação das classes ricas.

Todo o que sucedeu, ao longo destes anos, foi, exactamente, o contrário: os explorados foram taxados e mais taxados de impostos e roubados até ao tutano nos seus salários e pensões.

Ora, para restringir o endividamento crescente do Estado ter-se-á de limitar o papel da especulação bolsista, os lucros fabulosos dos bancos e das grandes empresas capitalistas, a restrição do aparelho supérfluo estatal (institutos, despesas militares e paramilitares, administrações de serviços e empresas públicos, etc).

Ora, esta orientação não poderá ser eficaz, se ficar isolada de uma idêntica perspectiva para a UE.

Significa isto que se terá de procurar aliados e estender a luta política a todo o espaço europeu. Ou seja atingir ali os interesses dominantes.


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