domingo, 13 de dezembro de 2015

SÍRIA: LUTA CONTRA O TERRORISMO OU PELA NOVA REPARTIÇÃO DO MÉDIO-ORIENTE?

1 – O Médio-Oriente está a ferro e fogo.
Nunca uma região fora da Europa, teve até agora uma tal concentração de poder de fogo em actividade permanente.

Fala-se em liberdade. Em luta contra o terrorismo. Em defesa do *mundo ocidental*, em jihad islâmica, em luta *contra os cruzados* cristãos.

Tudo muito retórico, muito palavroso, mas esquece-se o que, realmente, está em jogo:
As riquezas naturais, ou seja, a economia.


A partir do início deste século, com a decadência económica e política dos Estados Unidos da América, pondo em causa sua a supremacia imperial, com o surgimento de potências emergentes concorrenciais, nomeadamente a Rússia e China, exacerbaram-se contradições.

Ainda como superpotência militar única, os EUA, desprezando e aviltando os direitos e interesses dos povos, impuseram a lei da violência desabrida, desde o Iraque ao Afeganistão, passando pelo Paquistão, o Sudão e Iémen.

Desprezaram fronteiras, interesses nacionais, os aerópagos internacionais, como a ONU, transformaram a NATO, em força castrense de confronto permanente com a Rússia, desde a desagregação da antiga Jugoslávia e a integração forçada, na órbita daquela estrutura, dos antigos países do Leste, saídos do Pacto de Varsóvia, o que levou Moscovo a desencadear uma militarização desenfreada.

2 – A violência constante sobre os povos muçulmanos, a exploração continuada das riquezas dos seus países, fizeram desabrochar sentimentos nacionais, e mesmo libertadores, que não foram organizados em torno de concepções de progresso, mesmo revolucionárias.

Para tal óbice esteve o facto de uma grande parte dos sistemas políticos existentes em alguns países do Médio-Oriente se pautarem, então, por programas de poder reaccionário que diziam ser de *socialismo* pan-árabe.

Nesse sentido, a ânsia de libertação foi acolhida pelos apologistas do wahadismo, o islamismo pretensamente asceta e puro das convições dos *tempos do profeta* Maomé, que a Árabia Saudita financia e protege.

E que começou a ser posto em prática no Afeganistão com a Al-Qaeda, apoiada e enquadrada pelos EUA, que organizaram as forças militares dos enaltecidos +muajadins+, como «combatentes da liberdade», em luta contra os *infiéis ateus* dos tempos da União Soviética.

A destruição da URSS provocou uma desarticulação produtiva interna e também política (14 novos Estados separam-se) naquela antiga União estatal, com o consequente enfraquecimento da sua tecnologia militar.

Com esta situação criada, os EUA arrogaram-se em potência «líder mundial», procurado tornar-se suserano, sem contestação, da nova geopolítica.

Segundo o Comando da Frota dos EUA no Pacífico, 49 navios de superfície, seis submarinos, mais de 200 aeronaves e 25.000 tropas dos 22 países participaram do exercício neste ano.

Olharam com supremacia dominadora para os diferentes Estados, desprezaram, ainda mais, o mais tímido assomo de erguer a cabeça em torno das nacionalidades humilhadas. 

Espezinharam-na mesmo.

Dez anos depois do fim da URSS, uma nova liderança do país iniciou um processo de restauração económica e reforço da sua indústria castrense. Com uma visão, também, de restauração do antigo império.

Outros grandes Estados, como a China, fizeram uma caminhada enorme no desenvolvimento produtivo económico.

Potências regionais do Médio-Oriente fortemente hostilizados pelos Estados Unidos, caso do Irão, iniciaram, pela mesma altura, uma marcha forçada na evolução económica e militar nacional.

Depois da sangrenta invasão do Iraque, quer a Rússia, quer a China, quer o Irão, tinha a perfeita noção que os EUA iriam continuar a senda do imperialismo unilateral desesperado.

(As informações que apareciam de figuras ligadas à cúpula político-militar de Washington apontavam para isso. Caso do general Wesley Clark, um ex-comandante-chefe da NATO e director do Gabinete de Estratégia e Política, que escreveu no seu livro «Winning Modern Wars» que a Administração norte-americana, após o Iraque já tinha planos para atacar mais seis países: a Síria, o Líbano, a Líbia, o Irão, a Somália e o Sudão).


Começaram a esboçar uma parceria geoestratégica, que se iniciou pela economia e prossegue, actualmente, na esfera militar, inclusive operacional.

O aparecimento, em força, do chamado Estado Islâmico na Síria e no Iraque, com as ramificações líbias, egípcias e tunisinas, e, no presente, Afeganistão, deu-se no seguimento da estagnação diante do Estado sírio das chamadas «Primaveras Árabes».

(Curiosamente, nasceu em Alepo, uma cidade síria muito próxima da fronteira turca).

A queda de regimes ditatoriais no Magreb e em certos países do Médio-Oriente teve, pois, um objectivo estratégico que envolveu uma parceria entre uma superpotência, os EUA, e uma potência regional, Arábia Saudita, que produzia a ideologia político-religiosa pan-árabe, o wahabismo, e uma outra, a Turquia, submissas, ambas, aos ditames de Washington, mas com ambições próprias.

E desenrola-se, igualmente, numa altura em que o papel dos EUA, como entidade superpoderosa, minada por um militarismo sem freio, que lhe corrói uma economia, outrora pujante, também ela atravessada pela retracção e por uma crise profunda, não pode ser desempenhado pelos seus próprios e únicos exclusivos meios de *manu militari*.

3 – Regressamos, portanto, à Síria.

A Rússia avançou pelo meio da fraqueza norte-americana e parece estar a impor-se. Está a trazer aliados, mais consequentes ou mais fluidos.

Ao que estamos a assistir é que as diferentes potências estão a estropiar e estilhaçar todos os interesses nacionais do Estados estabelecidos.

Combater o Estado Islâmico?

Uma ova. Repartir por zonas de influência. O Estado Islâmico fica, justamente, na *fatia* dos EUA.

A questão é o petróleo e o gás e a respectiva estratégica geo-política.

O terrorismo é a arma dos vários potentados – mundiais e regionais – para servir os interesses imperialistas.

Naturalmente, a pacificação do Médio-Oriente tem de ser conquistada, em primeiro lugar, pelas populações locais, mas destruindo igualmente os tiranetes internos que enxameiam esses países.

Em segundo, com o afastamento da região – ou melhor dizendo a contenção – dos apetites imperialistas estrangeiros.

Na situação actual, todavia, o desfecho terá de passar necessariamente pelo resultado do confronto que está a envolver os que pretendem, no imediato, o seu retalhamento.


Se a estratégia da parceria Rússia, Irão, e em menor grau da China, vingar, Moscovo passará a potência dirigente não só do espaço em confronto, mas também da Europa, pois a unidade em torno da NATO está a fragmentar-se desde o conflito ucraniano.

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