1
– O Médio-Oriente está a ferro e fogo.
Nunca
uma região fora da Europa, teve até agora uma tal concentração de poder de fogo
em actividade permanente.
Fala-se
em liberdade. Em luta contra o terrorismo. Em defesa do *mundo ocidental*, em
jihad islâmica, em luta *contra os cruzados* cristãos.
Tudo
muito retórico, muito palavroso, mas esquece-se o que, realmente, está em jogo:
As
riquezas naturais, ou seja, a economia.

A
partir do início deste século, com a decadência económica e política dos
Estados Unidos da América, pondo em causa sua a supremacia imperial, com o
surgimento de potências emergentes concorrenciais, nomeadamente a Rússia e
China, exacerbaram-se contradições.
Ainda
como superpotência militar única, os EUA, desprezando e aviltando os direitos e
interesses dos povos, impuseram a lei da violência desabrida, desde o Iraque ao
Afeganistão, passando pelo Paquistão, o Sudão e Iémen.
Desprezaram
fronteiras, interesses nacionais, os aerópagos internacionais, como a ONU,
transformaram a NATO, em força castrense de confronto permanente com a Rússia,
desde a desagregação da antiga Jugoslávia e a integração forçada, na órbita
daquela estrutura, dos antigos países do Leste, saídos do Pacto de Varsóvia, o
que levou Moscovo a desencadear uma militarização desenfreada.
2
– A violência constante sobre os povos muçulmanos, a exploração continuada das
riquezas dos seus países, fizeram desabrochar sentimentos nacionais, e mesmo
libertadores, que não foram organizados em torno de concepções de progresso,
mesmo revolucionárias.
Para
tal óbice esteve o facto de uma grande parte dos sistemas políticos existentes
em alguns países do Médio-Oriente se pautarem, então, por programas de poder
reaccionário que diziam ser de *socialismo* pan-árabe.
Nesse
sentido, a ânsia de libertação foi acolhida pelos apologistas do wahadismo, o
islamismo pretensamente asceta e puro das convições dos *tempos do profeta*
Maomé, que a Árabia Saudita financia e protege.
E
que começou a ser posto em prática no Afeganistão com a Al-Qaeda, apoiada e
enquadrada pelos EUA, que organizaram as forças militares dos enaltecidos
+muajadins+, como «combatentes da liberdade», em luta contra os *infiéis ateus*
dos tempos da União Soviética.
A
destruição da URSS provocou uma desarticulação produtiva interna e também
política (14 novos Estados separam-se) naquela antiga União estatal, com o
consequente enfraquecimento da sua tecnologia militar.
Com
esta situação criada, os EUA arrogaram-se em potência «líder mundial»,
procurado tornar-se suserano, sem contestação, da nova geopolítica.

Olharam
com supremacia dominadora para os diferentes Estados, desprezaram, ainda mais,
o mais tímido assomo de erguer a cabeça em torno das nacionalidades humilhadas.
Espezinharam-na mesmo.
Dez
anos depois do fim da URSS, uma nova liderança do país iniciou um processo de
restauração económica e reforço da sua indústria castrense. Com uma visão,
também, de restauração do antigo império.
Outros
grandes Estados, como a China, fizeram uma caminhada enorme no desenvolvimento
produtivo económico.
Potências
regionais do Médio-Oriente fortemente hostilizados pelos Estados Unidos, caso
do Irão, iniciaram, pela mesma altura, uma marcha forçada na evolução económica
e militar nacional.
Depois
da sangrenta invasão do Iraque, quer a Rússia, quer a China, quer o Irão, tinha
a perfeita noção que os EUA iriam continuar a senda do imperialismo unilateral
desesperado.
(As
informações que apareciam de figuras ligadas à cúpula político-militar de
Washington apontavam para isso. Caso do general Wesley Clark, um
ex-comandante-chefe da NATO e director do Gabinete de Estratégia e Política,
que escreveu no seu livro «Winning Modern Wars» que a Administração
norte-americana, após o Iraque já tinha planos para atacar mais seis países: a
Síria, o Líbano, a Líbia, o Irão, a Somália e o Sudão).

Começaram
a esboçar uma parceria geoestratégica, que se iniciou pela economia e
prossegue, actualmente, na esfera militar, inclusive operacional.
O
aparecimento, em força, do chamado Estado Islâmico na Síria e no Iraque, com as
ramificações líbias, egípcias e tunisinas, e, no presente, Afeganistão, deu-se
no seguimento da estagnação diante do Estado sírio das chamadas «Primaveras
Árabes».
(Curiosamente,
nasceu em Alepo, uma cidade síria muito próxima da fronteira turca).
A
queda de regimes ditatoriais no Magreb e em certos países do Médio-Oriente teve,
pois, um objectivo estratégico que envolveu uma parceria entre uma
superpotência, os EUA, e uma potência regional, Arábia Saudita, que produzia a
ideologia político-religiosa pan-árabe, o wahabismo, e uma outra, a Turquia,
submissas, ambas, aos ditames de Washington, mas com ambições próprias.
E
desenrola-se, igualmente, numa altura em que o papel dos EUA, como entidade
superpoderosa, minada por um militarismo sem freio, que lhe corrói uma
economia, outrora pujante, também ela atravessada pela retracção e por uma
crise profunda, não pode ser desempenhado pelos seus próprios e únicos
exclusivos meios de *manu militari*.
3 –
Regressamos, portanto, à Síria.
A
Rússia avançou pelo meio da fraqueza norte-americana e parece estar a impor-se. Está a trazer
aliados, mais consequentes ou mais fluidos.
Ao
que estamos a assistir é que as diferentes potências estão a estropiar e
estilhaçar todos os interesses nacionais do Estados estabelecidos.
Combater
o Estado Islâmico?
Uma
ova. Repartir por zonas de influência. O Estado Islâmico fica, justamente, na
*fatia* dos EUA.
A
questão é o petróleo e o gás e a respectiva estratégica geo-política.
O
terrorismo é a arma dos vários potentados – mundiais e regionais – para servir
os interesses imperialistas.
Naturalmente,
a pacificação do Médio-Oriente tem de ser conquistada, em primeiro lugar, pelas
populações locais, mas destruindo igualmente os tiranetes internos que enxameiam esses
países.
Em
segundo, com o afastamento da região – ou melhor dizendo a contenção – dos apetites
imperialistas estrangeiros.
Na
situação actual, todavia, o desfecho terá de passar necessariamente pelo resultado do
confronto que está a envolver os que pretendem, no imediato, o seu retalhamento.
Se
a estratégia da parceria Rússia, Irão, e em menor grau da China, vingar,
Moscovo passará a potência dirigente não só do espaço em confronto, mas também
da Europa, pois a unidade em torno da NATO está a fragmentar-se desde o
conflito ucraniano.
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