domingo, 26 de dezembro de 2010

APOIO SOCIAL:É DO DOMÍNIO DE ESTADO OU DE PRIVADOS?



Algo vai mal no País quando o Chefe de Estado se submete ao ditames económicos e políticos de uma confissão religiosa.

























A chamada solidariedade social não estatal tem sido um sorvedouro de dinheiros públicos, e consequentemente, uma "mealheiro" de dimensões enormes nas mãos de privados.




Para muita gente, estas palavras podem parecer de uma radicalidade estranha. Para essa mesma gente, tal afirmação, no imediato, é um sinal de "desfasamento" da realidade que se vive. O papel da solidariedade é essencial para evitar casos extremos de carências sociais, de travões às pobrezas, entre muitos outros argumentos.



Eu sei que existem muitas pessoas envolvidos no processo, que dão do seu melhor para modificar o estado do descalabro de muitas comunidades que sobrevivem, pois são servidas unicamente por essa rede chamada de solidariedade social.



Tudo é certo. A questão é a economia. Acima de tudo a economia política. Todas estas instituições são geridas, não como instrumentos de bem-estar público - embora, teoricamente, prestem um "serviço social" - mas como empresas que dão lucro. Claro, caro leitor, que é muito difícil verificar, de imediato, este argumento.



Mas pensemos, meditemos, façamos contas.



Em primeiro lugar, um ponto de ordem:






A organização social do bem-estar da população deve ser obra da própria comunidade, e, o Estado como estrutura político-económica desse comunidade de interesse, até porque, em último caso, é o responsável pela gestão do dinheiro que nos saca, com impostos, também tem e deve ser o responsável pela manutenção e consecussão desse bem-estar. Sem lucros, sem objectivos de apropriação privada de parte substancial do dinheiro que é dotado para as diferentes instituições ditas de solidariedade social privadas.

E eu quando estou a referir-me a instituições de solidariedade social privadas estou a referir-me, essencialmente, a praticamente todas que são controladas pela Igreja Católica em Portugal.



Comecemos com exemplos. Os lares, que, na sua maioria, são geridos ou pelas Misericórdias, Paróquias ou associações aparentemente laicas, mas que no vértice tem um homem da Igreja Católica.



Um lar social privado recebe, mensalmente, este ano, da segurança social estatal, com quem tem um contrato, cerca de 725 euros. É verdade, é este valor: Dá perfeitamente para pagar três refeições diárias (10 euros por cada utente), e toda a logística, incluindo os salários dos seus funcionários. Se multiplicarmos estes 725 euros por 50 utentes, teremos, todos os meses, um valor de 36.250 euros. Mas, como todos estamos a par: um utente paga, normal e em média, entre 400 a 500 euros. Ou seja entre 12.000 e 15.000 euros. Suponhamos que estes 12/15 mil euros vão para os pagamentos de honorários e despesas de manutenção.






Reparem quanto fica nos cofres da gestão privada da "irmandade"?



O Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e as instituições Comissão Nacional de Solidariedade (CNIS), União Mutualista Portuguesa e União das Misericórdias assinaram um contrato em que seria destinados do Orçamento de Estado para as IPSS - creches, jardins-escolas, lares, centros de dia, centros de apoio a deficientes - 1,3 mil milhões de euros, mais sete por cento do que em 2009. Tal qual.




(Um pequeno aparte, mas curioso: A CNIS representa quase 70% das instituições de solidariedade do país. É dirigida, directamente, por um hierarca da Igreja Católica, padre Lino Maia. E naturalmente, quer mais dinheiro do Estado....)



Ou seja, em média, 2.500 euros, se apontarmos os números referidos pelos dirigentes das IPSS: cerca de 600 mil, a sua grande maioria frquentadores apenas de centros de apoio.




Claro que todos estes utentes pagam as suas mensalidades - os utilizadores de creches e restantes necessidades consideradas como "extras". O valor mensal de uma creche "social" (sem acrescentos) fica-se entre os 200 e os 250 euros. Se fizermos as contas a cerca de 60 mil crianças que podem, eventualmente, frequentar essas creches tira-se que essas instituições sacam qualquer coisa, mensalmente, entre 12 a 15 milhoes de euros. Num ano entre 144 e 170 milhões de euros. Só em creches...



Quantos aos idosos, segundo a Carta Social de 2008, estariam registados em lares cerca de 50 mil. No que diz respeito aos lares sociais, pagam normalmente 80 por cento do seu salário/pensão.




Outra questão, mas interligada com a anterior...nos dinheiros.





Nos últimos dias, acendeu-se uma polémica em que volta a estar em questão a organização social do Estado. E mais uma vez é a Igreja Católica que mete lenha para a fogueira, querendo colocar em causa o poder laico estatal. Sempre a velha estória. Os religiosos a querem conduzir o destino do país. E os tratantes cúmplices dessa estratégia, situados no altos cargos do Estado laico, como é o caso do actual Chefe de Estado a meter o bedelho no assunto.

A Igreja Católica - aproveitando-se da crise fermentada pelos próceres do liberalismo que se diz socialista - tenta calvagar as velhas ilusões medievais e retrógradas de que a orientação societária é da sua lavra. Porque são solidários, porque estão próximos das pessoas, blá, bla´...



Falamos do ensino. Este, desde que o Estado moderno se sobrepôs ao obscurantismo religioso cristão da Idade Média, foi um sector formativo da sociedade, fora das barras da usura e da limitação religiosa. Para o Estado, o ensino é um assunto da comunidade, da sua organização social.

Antes do 25 de Abril de 1974, o ensino básico e secundário era, em maioria, dominado pela concepção religiosa subjacente à estrutura do Estado Novo. Embora o ensino básico,praticamente desde a I República, já fosse de assunção pública e gratuita, era regido, no entanto, na ideologia, regido pelos cânones da Igreja Católica.




Por seu turno, o ensino secundário, embora tivesse, desde os anos 50, um liceu em cada capital do distrito, fora desses centros estava - em maioria, e com o objectivo do lucro - nas mãos da Igreja Católica.




Com o 25 de Abril, foi dada uma nova orientação à concepção desse ensino, sendo que, com algumas rapidez, se foram estendendo os centros escolares públicos a zonas que antes estavam nas mãos de colégios privados, quase todos sob a alçada, directa ou indirectamente, a Igreja Católica.



Ao longo de décadas, apesar dessa orientação, que aliás ficou inscrita na Constituição da República de 1976, houve um compromisso da parte dos dirigentes do Estado de então: nos locais onde a oferta pública não tivesse chegado, aquele daria subsídios à continuação de privados.



Com o avanço do ensino público - e particularmente - com o progresso que é dar, gratuitamente, aos portugueses formação educacional cada vez por mais anos, é contraproducente e mesmo anti-consticuional manter escolas e colégios privados com dinheiros de impostos.



Quem quiser manter colégios privados e quer quiser colocar os seus filhos nos mesmos, tudo bem, que os paguem do seu bolso, sem recorrer ao dinheiro público.

Num Estado não confessional, os ensinos são diferenciáveis, no seu financiamento pelo Estado. Este não tem que se precaver e apoiar o ensino privado. Este é assunto de quem o deseja, e então tem de o suportar. Ponto final.

Mas, a Igreja Católica não se quer submeter aos ditames da organização social do Estado laico. Então deste os seus hierarcas, bispo, cardeal e arcebispos, até ao seus vassalos como o padre Querubim Silva, Presidente da APEC (Associação Portuguesa de Escolas Católicas) manifestaram-se, ruidosa e ameaçadoramente, contra o poder de Estado, argumentando que está de pé uma questão ideológica.






Pois claro que está: ideológica e de lucro. As escolas católicas são antros do catolicismo e mais nada. De ensino público, bico calado, não se podem pronunciar. Não é com eles. A religião, para o Estado, é um assunto privado.



Mais grave é que Cavaco Silva, como Presidente da República, utiliza a inauguração de um colégio católico, Pedro Arrupe, - nem sequer lá deveria ter ido como Chefe de Estado - e considere que os ensino públicos e privados estão no mesmo patamar. "É uma missão que pode e deve contar com as instituições privadas que desenvolvem a sua acção neste sector e que constituem, muitas delas, uma referência de qualidade no panorama do ensino, projectando-se no percurso de sucesso dos seus alunos.

Não podemos prescindir, bem pelo contrário, da competição que estabelecem entre si e com o sector público", referiu, sem pudor, Cavaco Silva, sabendo que, constituiconalmente, tal afirmação é de uma transgressão a toda a prova.




O que é estranho é que os candidatos PRESIDENCIAS ditos laicos e defensores da Constituição se mantenham calados perante tal discurso do Chefe de Estado.

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