domingo, 5 de dezembro de 2010

ESPANHA: QUANDO A GREVE ASSUSTA O PODER


















Os controladores aéreos espanhóis cometeram um “crime de lesa-majestade” para com o poder político estabelecido: decretaram greve para defenderem reivindicações próprias, que passavam, essencialmente, pela defesa dos postos de trabalho, que estão ameaçados de imediato pela privatização da empresa estatal, que gere o espaço aéreo do país.



E, embora sejam muitos poucos, como assalariados, usaram uma arma que tinham ao seu dispor que é a greve, - naturalmente deveriam ter preparado, com mais argúcia, o acto que puseram em marcha, mas isso é outra coisa - e para dar impacto à sua reivindicação ultrapassaram os burocratas dirigentes sindicais das duas centrais, Comissiones Obreras (CCOO) e UGT, que são dados ao “respeito pelas instituições”, e só realizam reivindicações dentro dos “estritos limites da Constituição”. Pela leitura de uma parte de imprensa, constata-se que aquelas centrais estavam a par das reivindicações. Não foi, portanto, um acto encaminhado fora das discussões sindicais.



A greve é uma arma, que fere. Quem a vai utilizar tem de ponderar, com eficácia, a preparação. Caso contrário, não serve para nada. Tem, do outro lado, uma barricada poderosa. Mas, desse lado, se existir um governo que se reclame dos interesses dos trabalhadores, aquele deveria analisar o que a outra parte pretende com o seu protesto. É justo? É correcto?

A greve não é, para os dois lados, uma passeata. Mas, ela, para ter eficácia, tem de atingir esse outro lado da barricada. E, os controladores aéreos, porque são um sector minoritário, mas poderoso, em termos de reivindicação em força, utilizaram-na para atingir os seus objectivos. Mas, naturalmente, deveriam ter transmitido aos eventuais sectores populares atingidos, porque o faziam.


Mas, esta reivindicação espontânea, porque atingia todo o sistema económico-político, do regime capitalista espanhol, trazia um perigo de excepcional importância para toda a ordem estabelecida: desde o poder de Estado até aos compromissos das centrais sindicais oficiais, CCOO e UGT, esta umbilicalmente ligada ao governo e partido de Zapatero.


Se vingasse, ainda que nos suas mínimas pretensões, tal como foi posta em marcha, sem aviso, nem contemplação, colocou em pé de guerra toda a sociedade “respeitável” da oligarquia (económica e política) de Madrid.

Ora, o primeiro dever defensivo do governo Zapatero – e do inefável número dois Rubalcaba – foi o de pôr em marcha o Exército para “trucidar” as reivindicações pujantes de algumas centenas de trabalhadores, que ousava desafiar as prepotências do poder. Quem disse que o Exército é neutral?


E decretou o “estado de emergência”, o que aconteceu pela primeira vez desde 1975.


O regime monárquico utilizou este poder contra trabalhadores, mas não o fez quando uma parte do próprio Exército em 1981 se rebelou, de armas na mão – é verdade, de armas na mão, contra todo o poder de Estado.

/Recorda-se para que conste: Antonio Tejero Molina, então tenente coronel da Guarda Civil, encabeçou um golpe de Estado a 23 de Fevereiro de 1981 na Espanha, popularmente conhecido como "23-F". Na tarde daquele dia, entrou com 200 guardas civis no Congresso dos Deputados, que nesses momentos celebrava a sessão de investidura como presidente do governo de Leopoldo Calvo-Sotelo. Teve sequestrados os deputados até as 10 da manhã do 24 de Fevereiro de 1981, quando se entregou ao fracassar a tentativa de golpe de Estado. Neste golpe estavam implicados altos comandos das Forças Armadas, que tinham cumplicidade na própria Casa Real. Tejero foi julgado (e só ele) e apanhou …seis meses de prisão num quartel/.


Com esta dois casos, repare-se como age o poder de Estado. Com toda a repressão sobre os trabalhadores.

Ora, o que aconteceu com os controladores, não está isolado da agitação social que percorre Espanha devido às medidas anti-sociais que estão a ser implantadas pelo governo de Zapatero.
E, a acção minoritária dos controladores aéreos, que não tiveram apoio das centrais sindicais, serviram para que o governo fizesse a maior campanha de fechamento autoritário, que está a ser posto em prática em Espanha desde 1975.

E este sinal de autoritarismo deveria "fazer tocar campainhas" na consciência dos grandes meios de comunicação social. Eles, mais do que ninguém, tinham a missão de dar a versão correcta de quem entrava em greve. (É certo que uma forma de luta destas, por vezes, pode ser manipulável. A grande burguesia pode utilizar sectores de trabalhadores, para levar a água ao seu moinho, mas o que está a ocorrer, politicamente, em Espanha não é manipulação, mas repressão).
Ora, o que aconteceu até agora foi apenas cumplicidade, com o poder, da maior parte dos chamados grandes meios de comunicação social de Espanha – e não só da Europa, e, em particular de Portugal: Não deram a conhecer as razões dos controladores, e colocaram a máquina mediática lançando o labéu de “elite privilegiada” aos assalariados do controlo aéreo.


Esperemos pela repressão que se irá abater sobre esses assalariados, e verificar de que lado estão os burocratas das CCOO e UGT.




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